quinta-feira, 27 de maio de 2010

Colocando a roda do Dhamma em movimento

Dhammacakkapavattana Sutta
Colocando a roda do Dhamma em movimento

Assim ouvi.

Em certa ocasião, o Abençoado estava em Benares, no Parque do Gamo, em Isipatana.
Lá ele se dirigiu ao grupo de cinco bhikkhus:

“Bhikkhus, há esses dois extremos aos quais aquele que abandonou a vida em família e seguiu a vida santa não deve se entregar.

Quais dois?

A busca da felicidade nos prazeres sensuais, que são baixos, vulgares, grosseiros, ignóbeis e que não trazem benefício; e a busca da mortificação, que é dolorosa, ignóbil e que não traz benefício.

Evitando esses dois extremos o Tathagata despertou para o Caminho do Meio, que faz surgir a visão, que faz surgir a sabedoria, que conduz à paz, ao conhecimento direto, à iluminação, a Nibbana.

“E qual, bhikkhus, é o caminho do meio para o qual o Tathagata despertou, que faz surgir a visão ... que conduz a Nibbana?

É este Nobre Caminho Óctuplo:

entendimento correto,
pensamento correto,
linguagem correta,
ação correta,
modo de vida correto,
esforço correto,
atenção plena correta,
concentração correta.

Esse, bhikkhus, é o caminho do meio para o qual o Tathagata despertou, que faz surgir a visão, que faz surgir a sabedoria, que conduz à paz, ao conhecimento direto, à iluminação, a Nibbana.

“Agora, bhikkhus, esta é a nobre verdade do sofrimento:

nascimento é sofrimento,
envelhecimento é sofrimento,
enfermidade é sofrimento,
morte é sofrimento;
tristeza, lamentação, dor, angústia e desespero são sofrimento;
a união com aquilo que é desprazeroso é sofrimento;
a separação daquilo que é prazeroso é sofrimento;
não obter o que se deseja é sofrimento;
em resumo,
os cinco agregados influenciados pelo apego são sofrimento.

“Agora, bhikkhus, esta é a nobre verdade da origem do sofrimento:

é este desejo que conduz a uma renovada existência, acompanhado pela cobiça e pelo prazer, buscando o prazer aqui e ali; isto é, o desejo pelos prazeres sensuais, o desejo por ser/existir, o desejo por não ser/existir.

“Agora, bhikkhus, esta é a nobre verdade da cessação do sofrimento:

é o desaparecimento e cessação sem deixar vestígios daquele mesmo desejo, abrir mão, descartar, libertar-se, despegar desse mesmo desejo.[1]

“Agora, bhikkhus, esta é a nobre verdade do caminho que conduz à cessação do sofrimento:

é este Nobre Caminho Óctuplo:

entendimento correto,
pensamento correto,
linguagem correta,
ação correta,
modo de vida correto,
esforço correto,
atenção plena correta,
concentração correta.

“’Esta é a nobre verdade do sofrimento’:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade do sofrimento deve ser completamente compreendida:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade do sofrimento foi completamente compreendida:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’ Esta é a nobre verdade da origem do sofrimento:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade da origem do sofrimento deve ser abandonada:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade da origem do sofrimento foi abandonada:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta é a nobre verdade da cessação do sofrimento:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade da cessação do sofrimento deve ser realizada:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade da cessação do sofrimento foi realizada:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta é a nobre verdade do caminho que conduz à cessação do sofrimento:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade do caminho que conduz à cessação do sofrimento deve ser desenvolvida:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“’Esta nobre verdade do caminho que conduz à cessação do sofrimento foi desenvolvida:

assim, bhikkhus, com relação a coisas não ouvidas antes, surgiram em mim a visão, a compreensão, a sabedoria, o verdadeiro conhecimento e a iluminação.

“Enquanto, bhikkhus, meu conhecimento e visão dessas Quatro Nobres Verdades como na verdade elas são, nas suas três fases e doze aspectos, [2] não estava completamente purificado desse modo, não reivindiquei ter despertado para a insuperável perfeita iluminação neste mundo com os seus devas, maras e brahmas, esta população com seus contemplativos e brâmanes, seus príncipes e povo.

Mas quando meu conhecimento e visão dessas Quatro Nobres Verdades como na verdade elas são, nas suas três fases e doze aspectos, estava completamente purificado desse modo, reivindiquei ter despertado para a insuperável perfeita iluminação neste mundo com os seus devas, maras e brahmas, esta população com seus contemplativos e brâmanes, seus príncipes e povo.

O conhecimento e visão surgiram em mim:

‘A libertação da minha mente é inabalável.
Este é o meu último nascimento.
Não há mais vir a ser.’

Isto foi o que o Abençoado disse.

Os cinco bhikkhus ficaram satisfeitos e contentes com as palavras do Abençoado.
E enquanto o Abençoado discursava, o olho imaculado do Dhamma surgiu no Venerável Kondañña:

‘Tudo que está sujeito ao surgimento está sujeito à cessação.’

E quando a roda do Dhamma havia sido colocada em movimento pelo Abençoado, os devas da terra exclamaram:

“Em Benares, no Parque do Gamo, em Isipatana, esta insuperável roda do Dhamma foi colocada em movimento pelo Abençoado, e não poderá ser detida por nenhum brâmane ou contemplativo, ou deva, ou Mara, ou Brahma, ou qualquer um no mundo.”

Ouvindo a exclamação dos devas da terra, os devas do Reino dos Quatro Grandes Reis também exclamaram… os devas dos Trinta e Três…. os devas do Yama…. os devas do Tusita… os devas do Nimmanarati… os devas do Paranimmita-vasavatti…. os devas do cortejo de Brahma também exclamaram:

“Em Benares, no Parque do Gamo, em Isipatana, esta insuperável roda do Dhamma foi colocada em movimento pelo Abençoado, e não poderá ser detida por nenhum brâmane ou contemplativo, ou deva, ou Mara, ou Brahma, ou qualquer um no mundo.”

Assim, naquele momento, naquele instante, naquele segundo, a exclamação subiu até os distantes mundos de Brahma e esse sistema cósmico com dez mil mundos tremeu, estremeceu e se abalou e uma intensa, imensurável e gloriosa luminosidade surgiu no mundo ultrapassando a divina majestade dos devas.

Então, o Abençoado exclamou:

“Kondañña de fato compreendeu!
Kondañña de fato compreendeu!”

E foi assim que o Venerável Kondañña adquiriu o nome Añña-Kondañña – Kondañña aquele que Compreendeu.”

Notas:[1]

Em Pali:
caga, patinissagga, mutti, analaya.

Caga, abrir mão,
também ocorre com freqüência como significando generosidade.
Ajaan Brahm interpreta que já neste primeiro discurso o Buda traça as linhas mestras do seu método de desenvolvimento mental que está baseado no abandono, na renúncia, no soltar-se.

A interpretação de Ajaan Brahm para cada um dos termos em Pali é a seguinte:

caga:

generosidade – entregar-se com o corpo e a mente, de forma completa para a prática meditativa sem esperar absolutamente nada em retorno.
Essa é a perfeição da generosidade, dar tudo sem esperar receber nada em troca.

patinissagga:

descartar – na meditação não se deve esperar obter alguma coisa mas sim abandonar as coisas, livrar-se das possessões mentais: os pensamentos, memórias, experiências, idéias, medos, de modo que o meditador esteja livre e absolutamente vazio.
O propósito da meditação não é acumular coisas mas livrar-se delas.

mutti:

liberdade – qualquer lugar onde não queremos estar se transforma numa prisão, enquanto que em qualquer lugar onde queremos estar, onde estejamos felizes, nos sentimos livres.
Sentindo-se feliz na meditação não há modo que o desejo possa surgir e interferir na meditação, é uma questão de atitude.

analaya:

despegar – nada gruda ou se estabelece na mente, nem mesmo as experiências belas, as coisas não são acumuladas, há sempre o vazio na mente, as coisas ocorrem e são abandonadas pois imediatamente passam a pertencer ao passado.

[2] As três fases são:

(i) o conhecimento de cada verdade, ex:
“Esta é a nobre verdade do sofrimento”;

(ii) o conhecimento da tarefa a ser realizada com relação a cada verdade, ex:
“Esta nobre verdade do sofrimento deve ser completamente compreendida”;

(iii) o conhecimento de ter completado a tarefa em relação a cada verdade, ex:
“Esta nobre verdade do sofrimento foi completamente compreendida.”

Os doze aspectos são obtidos aplicando as três fases às quatro verdades.
Este tipo de esquema, na tradição legal e filosófica hindu, é chamado de roda.
Neste caso a roda tem doze raios, unidas no cubo pelo conhecimento e visão das coisas como elas na verdade são.
No entanto, os textos antigos que tratam da roda do Dhamma contêm muito mais do que os doze raios, sendo a forma encontrada para indicar que a roda está em movimento.

saiba mais
acesse: http://www.acessoaoinsight.net/sutta/SNLVI.11.php

enviado por José Elizon Oliveira

P.S. O Nobre Caminho Óctuplo foi postado em Abril.