sexta-feira, 30 de abril de 2010

Conhecimento

Sobre o Autor
Carlos Cruz atua como Conferencista em Desenvolvimento Humano, é Coach Executivo, de Equipes e Diretor da UP TREINAMENTOS & CONSULTORIA - carlos@carloscruz.com.br -
www.carloscruz.com.br


Conhecimento apenas não basta, tenha aptidão.

Conheço pessoas que estão numa busca constante e incessante pelo conhecimento. No entanto, percebo que muitos passam parte da sua vida apenas conhecendo. Percebo também que existem grandes conhecedores desempregados e grandes empreendedores que conhecem muito pouco comparados aos estudiosos, mas são tão versáteis e excepcionais que não conseguimos descrever tamanha proficiência e habilidade para realizarem atividades e atingirem resultados.

Não basta apenas ter conhecimento, é necessário ter aptidão. A maioria das pessoas considera erroneamente conhecimento e aptidão a mesma coisa. Asseguro que muitas delas estão se auto-sabotando e travadas sem dar nenhum passo, apenas aumentam o tamanho da sua cabeça. Podemos chamá-las de “cabeçudas”, pois possuem tanto conhecimento em suas mentes que não são capazes de utilizar metade, e não desenvolvem aptidão para transformarem o conhecimento em resultados práticos, duradouros e imediatos. Na realidade, conhecimento e aptidão são muito diferentes e, ao mesmo tempo, complementos um para o outro.

Podemos fazer uma breve reflexão para perceber a diferença. Perceba quantas pessoas conhecem sobre técnicas de administração, mas não conseguem administrar seu próprio negócio. Outras sabem que fumar faz mal e continuam fumando. Quantas pessoas sabem como falar em público, estudam e conhecem inúmeras técnicas, no entanto, poucas são as que realmente sabem se expressar. Quantas pessoas reconhecem a importância de colocar um objetivo específico por escrito e elaborar um planejamento, porém, quase nunca os fazem. Outras sabem que comer fritura faz mal, mas não possuem aptidão suficiente para comerem apenas o que é saudável. Quantas pessoas sabem como chutar uma bola, conhecem as estratégias de um jogo de futebol e não são capazes de entrar em campo e fazer um gol.

É importante destacar que para ter aptidão é preciso ter conhecimento e para ter conhecimento é preciso ter aptidão. Aptidão está relacionada diretamente as atitudes. O que as pessoas precisam é de atitude.

Dicas para expandir o conhecimento.
• Procure ouvir música barroca para ler e estudar, de acordo com o pai da aprendizagem acelerada, Dr. Georgi Lozanov, essa música relaxa e, ao mesmo tempo, deixa a sua mente alerta e capaz de concentrar-se. Alguns compositores para você ouvir são Bach, Mozart, Vivaldi.
• Leia livros, revistas, artigos;
• Freqüente cursos, seminários, treinamentos, palestras, feiras, congressos, exposições;
• Observe outras pessoas realizando o que você quer e precisa fazer;
• Encontre um mentor, um modelo, um especialista na área que tem interesse;
• Aproxime-se de pessoas que estimulem seu potencial e estejam em sintonia com os seus objetivos;
• Conheça outras pessoas que realizaram de modo bem sucedido o que você quer realizar. Pergunte como elas fizeram isso. Compartilhe seus conhecimentos.
• Programe-se para todos os dias antes de dormir escrever o que aprendeu no seu dia, depois compare com as outras datas.
• Experimente realizar coisas que nunca fez, ler sobre assuntos que nunca leu, praticar um esporte que nunca praticou, conversar com pessoas que nunca conversou. Experimente fazer amizades com pessoas mais velhas e mais novas, freqüentar ambientes que não conhece.
• É sempre bom aprender algo diferente e agregar valor ao seu conhecimento. Quanto mais informação puder recolher e armazenar na sua mente, melhor e mais inteligente você pode ser. Basta partir para o próximo passo e utilizar seu conhecimento estrategicamente, desenvolvendo as suas aptidões.

Dicas para aumentar a sua aptidão:
• Todos os dias, assim que acordar, estabeleça o objetivo de aprender algo novo e transformar seu conhecimento em realizações, e quando chegar no final do dia avalie o que você aprendeu e realizou. Faça isso diariamente.
• Desconfie de si mesmo e pergunte-se “Como posso melhorar isso?”
• Pratique, treine, repita, faça, experimente.
• Encontre oportunidades para exercitar, crie-as.
• Escove os dentes com outra mão.
• Coma com os talheres invertidos.
• Aplique o seu conhecimento em qualquer oportunidade, crie-as.
• Experimente, dê o 1º passo;
• Aprenda 10 vezes mais do que alguma vez terá necessidade de aplicar;
• Exercite, treine, treine novamente, experimente, e treine novamente.

O ser humano realizado é aquele que utiliza seu conhecimento estrategicamente através de suas aptidões, fazendo a diferença para si e para as pessoas ao seu redor. Faça melhor, faça a diferença!


acesse:
http://www.artigos.com/artigos/humanas/sucesso-e-motivacao/conhecimento-apenas-nao-basta,-tenha-aptidao.-4699/artigo/

Quem é o Buda?

(Do livro A Pebble for your pocket – para crianças de 6 a 12 anos – Thich Nhat Hanh)
(Traduzido por Leonardo Dobbin)


Quem é o Buda?

Alguns anos atrás, eu visitei uma vila na Índia chamada Uruvela. Dois mil e seiscentos anos atrás, um homem chamado Sidarta morou perto dessa vila. Sidarta é o homem que depois ficou conhecido como o Buda.

A vila de Uruvela ainda é muito parecida com aquela época. Não há edifícios, supermercados e auto-estradas. É muito agradável. As crianças também não mudaram. Quando Sidarta morou aqui, algumas crianças dessa vila se tornaram seus amigos e levavam para ele comida e presentes simples.

Há um rio que corre perto da vila. É onde Sidarta costumava tomar banho. Uma grama chamada “kusa” ainda cresce nas margens do rio. É o mesmo tipo de grama que uma das crianças deu a Sidarta para usar como almofada para sentar. Eu andei ao longo do rio e cortei um pouco dessa grama e trouxe para casa comigo.

No outro lado do rio há uma floresta. Foi lá que Sidarta sentou em meditação embaixo de uma árvore chamada “árvore Bodhi”. Foi embaixo dessa árvore que ele se tornou o Buda.

Um Buda é qualquer um que é desperto – que é consciente de tudo que acontece dentro e em volta dele e que entende e ama profundamente. Sidarta se tornou um ser totalmente desperto – um Buda. Ele é o Buda que aceitamos como nosso professor. Ele disse que cada um de nós tem uma semente de despertar dentro de nós e que todos nós somos futuros Budas.

Um estudante meu quando era muito jovem lutava com a questão: quem é o Buda? O nome do estudante era Hu e esta é a sua história.

Quando Hu tinha 6 ou 7 anos, ele perguntou a seu pai e mãe se ele podia se tornar um monge. Hu adorava ir ao templo budista. Ele costumava ir lá com seus pais nos dias de lua nova e de lua cheia para oferecer flores, bananas, mangas e todo tipo de frutas exóticas para a Buda.

No templo, Hu era sempre tratado com gentileza. Quando as pessoas vinham ao templo, pareciam mais relaxados e amistosos. Hu também estava consciente que o monge chefe gostava dele. Ele dava banana e manga a Hu cada vez que ele vinha. Era por isso que Hu amava ir ao templo.

Um dia ele disse, “Mamãe, quero me tornar um monge e morar no templo.” Eu acho que ele queria se tornar um monge porque ele gostava de comer bananas. Não o culpo. No Vietnã, há muitos tipos de bananas que são tão boas...

Mesmo sendo jovem, seu pai e mãe decidiram deixá-lo ir ao templo como noviço. O monge chefe deu a Hu um minúsculo robe marrom para vestir. No seu novo e bonito robe, ele parecia um monge bebê.

Quando se tornou um monge, Hu acreditava que o Buda amava bananas, mangas e tangerinas porque sempre que as pessoas vinham ao templo eles traziam bananas, mangas, tangerinas e outras frutas, e as colocavam na frente do Buda. Na pequena cabeça de Hu aquilo só podia significar que o Buda gostava muito daquelas frutas.

Uma noite, ele esperou no templo até que todos os visitantes tivessem ido para casa. Ele parou quieto fora da entrada da sala do Buda. Ele verificou para ter certeza que ninguém mais estava por perto. Então ele espiou a sala do Buda. A estátua do Buda era tão grande como uma pessoa real. Na cabeça jovem de Hu, a estátua era o Buda.

Hu imaginava que o Buda sentava muito parado durante todo o dia, e quando a sala estava vazia, ele alcançava uma banana. Hu esperou e observou, esperando ver o Buda pegar uma das bananas empilhadas a sua frente. Esperou por muito tempo, mas não viu o Buda pegar a banana. Ele estava frustrado. Não podia entender porque o Buda não comia nenhuma das bananas que as pessoas levavam a ele.

Ele não ousava perguntar ao monge chefe, porque estava com medo que o monge pensasse que ele era bobo. Na verdade, constantemente nos sentimos assim. Não ousamos fazer perguntas por que temos medo de sermos chamados de bobos. O mesmo era verdade para Hu. E porque não ousava perguntar, ele estava confuso. Acho que eu teria buscado alguém para perguntar. Mas Hu não perguntou a ninguém.

Quando ficou mais velho, um dia lhe ocorreu que a estátua do Buda não era o Buda. Que conquista! Esta realização o fez muito feliz. Mas então uma nova questão surgiu. “Se o Buda não está aqui, então aonde ele está? Se o Buda não está no templo, onde está o Buda?” Cada dia ele via pessoas virem ao templo e reverenciar a estátua do Buda. Mas onde estava o Buda?

No Vietnã, pessoas que praticam a tradição do budismo Terra Pura acreditam que os Budas ficam na Terra Pura, na direção do Oeste. Um dia, Hu ouviu alguém dizer que a Terra Pura era a casa dos Budas. Isto fez Hu acreditar que o Buda estava na Terra Pura, o que o deixou muito triste. Porque, ele quis saber, o Buda escolheu viver tão longe das pessoas? Portanto isto criou outra pergunta em sua mente.

Eu conheci Hu quanto ele tinha 14 anos, e ainda estava querendo saber sobre isso. Eu expliquei a ele que o Buda não está longe da gente. Eu disse a ele que o Buda está dentro de cada um de nós. Ser um Buda é ser consciente do que está dentro de nós e a nossa volta em cada momento. Buda é o amor e o entendimento que cada um carrega no seu coração. Isto fez Hu feliz.

Quando Hu cresceu, ele se tornou diretor da Escola de Serviço Social do Vietnã. Ele treinou monges e monjas, homens e mulheres jovens, a ajudar a construir vilas que foram bombardeadas durante a guerra do Vietnã.

Em qualquer lugar que você veja amor e entendimento, há o Buda. Todos podem ser Buda. Não imagine que o Buda é uma estátua ou alguém com um halo elegante sobre sua cabeça ou usa robe amarelo. Um Buda é uma pessoa que está consciente sobre o que está acontecendo dentro de si e a sua volta e tem muito entendimento e compaixão. Seja o Buda homem ou mulher, jovem ou não, ele é sempre agradável e refrescante.

A Pedra Preciosa

No budismo, há uma imagem do mundo que é maravilhosa. A imagem mostra um mundo cheio de jóias radiantes e brilhantes. Este mundo é chamado o Dharmakaya. O Dharmakaya não é separado do mundo que vemos todos os dias. Quando olhamos de perto, descobriremos que nosso mundo diário é cheio de tesouros maravilhosos. Muito tempo atrás, o Buda contou uma história para nos lembrar que esses tesouros maravilhosos estão sempre lá para nós, apenas se formos capazes de vê-los.

Uma vez havia um homem rico que tinha um filho preguiçoso. O jovem não sabia como fazer nada a não ser gastar o dinheiro do pai. Como era o filho de um homem rico, nunca aprendeu a negociar e não sabia fazer nada para viver.

O pai estava preocupado que se ele morresse, seu filho poderia vender tudo da casa e ficar pobre. Embora ele tentasse bastante mudar seu filho, no final o pai percebeu que isso não aconteceria durante sua vida.

Assim, o pai amava muito seu filho e não podia parar de se preocupar com ele. Então uma noite depois de muito pensar, teve uma idéia. Na manhã seguinte, foi ao seu alfaiate e pediu que ele fizesse um casaco quente. Quando o casaco estava pronto, o velho o levou para casa e o vestiu todo dia até que parecesse usado.

Um dia, ele chamou seu filho e disse: “Meu filho, quando eu morrer, você herdará tudo que eu tenho. Espero que você tome conta da minha herança bem. Se, contudo, você decidir vender todos os meus bens, eu apenas peço uma coisa.” Pegando o casaco, ele disse: “Eu peço que você fique com esse casaco e o vista o tempo todo. Isto será suficiente para me fazer feliz.”

O filho olhou para o casaco usado de seu pai. Isto ele poderia fazer facilmente.

“Não se preocupe, pai. Eu prometo que não o venderei.”

Logo depois disso seu pai morreu e o jovem herdou toda a sua herança. E exatamente como seu pai tinha previsto, o filho vendeu todos os seus pertences. Ele manteve sua promessa, contudo, e não vendeu o casaco.

Não demorou muito para que o filho gastasse todo o dinheiro recebido da venda dos bens do pai. E como seu pai temia, ele logo se tornou muito pobre. Um por um, seus amigos o abandonaram. E como ele não sabia como ganhar seu sustento sozinho, ele logo não tinha onde morar.

Sem casa ou amigos, o filho começou a vagar de lugar em lugar. Em muitas noites ele tinha que dormir ao relento sob uma árvore e sem jantar. Mas ele ainda tinha o casaco de seu pai que o mantinha aquecido.

Muitos anos se passaram e o filho vagava de um lugar para outro sem teto sobre sua cabeça. Então um dia enquanto ele estava deitado no chão, sentiu algo duro sob seu corpo. Primeiramente ele pensou que era uma pedra do chão. Mas quando ele olhou não havia pedra.

Determinado a descobrir o que o objeto duro era, ele verificou dentro dos bolsos do casaco que estava vestindo, mas não havia nada. Ele ficou mais curioso e procurou no casaco inteiro. De repente ele sentiu algo dentro do forro do casaco surrado. Ele cortou o forro e para sua surpresa caiu uma pedra. Seu pai colocou uma pedra preciosa no forro do casaco!

Depois de muitos anos pensando que era pobre, ele logo percebeu que estava rico. Mas agora ele aprendeu a lição. Ele não iria esbanjar sua herança desta vez. Ele comprou uma casa e iniciou um negócio. Ele começou a ganhar seu sustento. Ele estava super feliz! Grato por ter tido uma segunda chance, ele estava feliz por partilhar sua riqueza com os outros.

Depois de contar sua história, o Buda disse que todos somos como o filho. Também herdamos grande riqueza, mas como o filho, nós não sabemos e nos comportamos como se fôssemos pobres. Temos um tesouro de iluminação, de entendimento, de amor e de alegria dentro de nós. Se soubermos como redescobri-los e permitir que eles se manifestem, ficaríamos extremamente felizes. Há muitas chances para nós sermos felizes. Mas permanecemos pensando que somos apenas um filho sem nada.

Portanto é hora de voltar a receber sua herança. Estando plenamente atento pode ajudá-lo a pedir por ela. Com plena atenção você verá que tem muitas pedras preciosas no forro de seu casaco. Você precisa apenas olhar para cima de forma a ver o céu azul. Você precisa apenas inspirar e expirar que ver que o dia hoje é belo e vale a pena viver. Você precisa apenas inspirar e expirar para ver que aqueles que você ama estão ainda vivos em torno de você, e você pode ser muito, muito feliz.

Este é um poema que eu escrevi depois de ler a história do Buda sobre o homem rico e seu filho:

Pedras preciosas estão em todos os lugares no cosmos
E dentro de cada um de nós.

Eu quero oferecer um punhado para você, meu querido amigo
Sim, esta manhã, eu quero te oferecer um punhado,
Um punhado de diamantes que brilham da manhã até a noite
Cada minuto de sua vida diária é um diamante que contém céu e terra, brilho do sol e rio.

Nós apenas precisamos respirar gentilmente para o milagre ser revelado:
Pássaros cantando, flores desabrochando.

Aqui está o céu azul, aqui está a nuvem branca flutuando, seu olhar amável, seu sorriso bonito.
Todos estes estão contidos em uma jóia.

Você que é a pessoa mais rica na Terra e se comporta como um filho desamparado,
Por favor, volte para sua herança.

Vamos nos oferecer felicidade e aprender a
Habitar no momento presente.
Vamos acalentar a vida com nossos dois braços
E deixar ir nosso esquecimento e desespero.



Comente esse texto em
http://sangavirtual.blogspot.com

saiba mais
acesse:
http://www.viverconsciente.com/textos/quem_e_o_buda_pedra_preciosa.htm

Budismo e Psicoterapia

Budismo e Psicoterapia -- superando os complexos
(Palestra de Dharma de Thich Nhat Hanh em 26 de março de 2009 em Plum Village)

Bom dia querida Sangha, hoje é 26 de Março de 2009, e nós estamos no Upper Hamlet, durante nosso Retiro de Primavera.

Os ensinamentos do Buda, especialmente a prática da plena consciência, começaram a ser mais difundidos na nossa sociedade, principalmente no campo da psicologia, da psicoterapia, na educação, na ciência, e no trabalho social.

Muitos de nós querem reunir a prática da meditação e a psicoterapia, porque todos nós queremos curar a nós mesmos e curar o mundo; queremos tirar o melhor do insight ocidental sobre psicologia, psicoterapia e também do budismo, porque há no budismo insights muito profundos sobre nossa mente, como transformar nossa mente, como sofrer menos, como encerrar o sofrimento.

Mas nós temos algumas dificuldades em tentar reunir as duas coisas, por causa da nossa maneira habitual de pensar. Por exemplo, no budismo aprendemos que não há um eu, e todas as práticas budistas devem ser baseadas na prática do não-eu. Na psicoterapia, porém, o eu é muito importante: você precisa ter um eu saudável, você precisa fortalecer o eu antes de ser uma pessoa saudável -- então como fazer, o que fazer?

Há aqueles que propuseram que não se deveria fazer meditação antes de ter feito alguma psicoterapia. Primeiro alguma terapia e depois meditação, ou então seria muito perigoso, porque se o seu eu não fosse forte o suficiente e você se dedicasse à meditação, sua situação poderia piorar. Portanto, a conclusão é que você primeiro faz algum tipo de terapia e só depois faz meditação budista.

E como na psicoterapia o eu é considerado algo de que temos de cuidar, quando você tem baixa auto-estima você possui diversos tipos de problemas, e por isso você tem que se livrar da sua baixa auto-estima. A impressão é a de que você tem de se consolidar, você tem de fortalecer o eu para superar o sofrimento e a doença. Muitos psicoterapeutas estiveram pensando como ajudar seus pacientes a livrar-se da baixa auto-estima. A baixa auto-estima parece ser a fundação de muitas desordens mentais.

Mas quando olhamos do ponto de vista budista, vemos que não somente a baixa auto-estima está na fundação do sofrimento, mas que a alta auto-estima também está. Há muita gente que pensa grande sobre si mesma. Eles têm o complexo de superioridade, e muita arrogância, e por conta disso criaram muito sofrimento para si e para as outras pessoas. A expressão “alta auto-estima” não parece ter uma conotação negativa assim como a baixa auto-estima. Mas se olharmos em profundidade veremos que o complexo de superioridade é tão perigoso quanto o complexo de inferioridade.

Então, sob a luz do ensinamento budista não apenas a baixa auto-estima não é boa, mas a alta auto-estima não é boa também.

E não somente não são boas a baixa auto-estima ou a alta auto-estima, mas também o complexo de igualdade não é bom. Você pode pensar que não deve sentir-se acima das outras pessoas nem abaixo delas, então pensa que sentir-se igual às outras pessoas é o correto, é o bom. Mas no budismo temos um outro complexo, o complexo de igualdade. Sou tão bom quanto ele, sou tão bom quanto ela – isso também é um complexo. Porque o complexo vem do fato de que você compara, um eu com outro eu. E quando você se compara, vê-se superior, inferior ou então igual. Mas no ensinamento do Buda não há um eu, e se você não tem um eu, não tem o que comparar. E se não comparar, não há complexo, nenhum.

Então, como reconciliar o ensinamento sobre não-eu com o ensinamento sobre a consolidação do eu? Remover a baixa auto-estima é uma grande questão na psicoterapia. Portanto, há alguns dentre nós que dizem que primeiro devemos fazer alguma terapia para só depois tentarmos a meditação. Primeiro fortalecer-nos, para depois abdicarmos. Primeiro eu, depois não-eu. Assim, a prioridade é a psicoterapia, e depois a meditação. Existe muita confusão nesse pensamento, porque você nunca se aprofunda o suficiente em nenhuma das duas disciplinas, em termos de prática. Fica-se mais no nível da especulação e dos conceitos. Mesmo nos círculos budistas há quem fique no nível dos conceitos e da especulação.

Num instituto budista nós aprendemos muito sobre budismo, teoricamente, e não temos prática suficiente, que nos ajude a ter insight, que é o que vai nos transformar e remover o sofrimento.

Quando você vem a Plum Village, você percebe que aqui não é um instituto de estudos budistas no sentido comum. Sim, aqui aprende-se budismo; todos os dias nós aprendemos. Mas nós nos dedicamos a por em prática tudo aquilo que aprendemos. Não nos contentamos em falar sobre a filosofia profunda, o profundo ensinamento do Buda. Não ficamos discutindo sobre nirvana, a dimensão absoluta, mahaprajnaparamita ou as Quatro Nobres Verdades simplesmente para satisfazer nossa curiosidade. Budismo -- não como conhecimento, mas como prática.

Então quando você fala sobre as Quatro Nobres Verdades, o Caminho Óctuplo, impermanência, não-eu – temos de encontrar maneiras de experienciar estas coisas, diretamente, no nosso cotidiano. E Plum Village é uma tradição que enfatiza bastante este aspecto. Estudos budistas deveriam ser bem palpáveis, e nós devemos ser capazes de aplicá-los em nosso dia-a-dia.

Por exemplo, quando você está praticando Inspirando. No início, você acredita que é você quem quer inspirar. Sou eu quem está inspirando, não uma outra pessoa. “Inspirando, eu sei que estou inspirando” – assim é a frase quando traduzida para o Inglês (Breathing in, I know I am breathing in). Mas em outros idiomas, assim como em Vietnamita, não há necessidade de usar o eu, ou o você. [Thây fala em Vietnamita] Inspirando, sei que estou inspirando; Inspirando, sabendo que estou inspirando. É possível dizer assim.

No início, podemos achar que há um “eu” inspirando e expirando. Mas se praticarmos realmente, iremos descobrir que ninguém está inspirando ou expirando. Há somente a inspiração acontecendo, e a expiração acontecendo. Claro que há a intenção de inspirar, a intenção de expirar, o prazer de inspirar, o prazer de expirar. O fato é que a respiração está lá, existe. Mas você não precisa de um “ser respirador” para respirar. Isso pode ser difícil de aceitar, no começo, porque você ainda está no nível da conceitualização. Porém, com um pouco de prática você irá enxergar e tocar a verdade. Não há um “respirador”, há somente a respiração acontecendo. Não há um pensador, há apenas os pensamentos se sucedendo.

Nós não estamos familiarizados com isso, porque achamos que precisa existir um pensador para tornar possível o pensar. Penso, logo existo, logo sou. Se o eu não existir, o pensar não poderá existir, então o fato de o pensamento existir é uma prova de que há um “eu”, um pensador.

Há uma diferença de pensamento, de percepção das coisas, dentro dessa tradição. E todos nós fomos influenciados pelo modo cartesiano de pensar -- precisamos reconsiderar isso.

Você está convidado a inspirar e a olhar em profundidade e ver que, enquanto está inspirando, todos os seus ancestrais estão inspirando junto com você. [pausa para inspirar] E este é o início da verdadeira experiência do não-eu.

Em Plum Village temos o exercício que diz Inspirando, convido o meu pai a desfrutar da inspiração comigo. Eu sei que meu pai existe em cada célula do meu corpo, de alguma forma, e eu sou uma continuação do meu pai. Ele transmitiu seus genes a mim, e está presente de fato em todas as células do meu corpo. É por isso que, inspirando, posso reconhecer meu pai no meu próprio corpo, em cada célula do meu corpo, e isso é algo possível e também fácil de fazer. Então Inspirando, convido o meu pai a desfrutar da inspiração comigo torna-se possível e não requer muita imaginação – porque isso é uma realidade, você é a continuação do seu pai. Você não pode tirar o seu pai de você. Você não pode tirar a sua mãe de você. O fato é que quando você está inspirando, ela está inspirando em você... Mãe, inspirando eu me sinto tão leve... Você se sente tão leve quanto eu? Este é um dos exercícios de respiração oferecidos aqui em Plum Village. Inspirando, eu me sinto tão leve... Paizinho, você se sente tão leve quanto eu?

Enquanto praticamos respirar assim, nós não estamos brigando contra a idéia de um eu, nós estamos saindo da noção de um eu. Porque nós sabemos que o eu é feito de elementos não-eu. Sou feito de pai, mãe, ancestrais, ar, água, nuvem, e muito mais... Então, se reconheço todos estes elementos não-eu constituindo o eu, começo a ver a noção do eu fragmentar-se em muitas partes.

Não há um eu, há apenas uma noção de eu.

É possível para todos nós nos sentarmos assim relaxadamente, e respirarmos com nossos ancestrais, por nossa mãe, por nosso pai, nossa avó, nosso avô – todos os nossos ancestrais. Que maravilha saber que você está ali representando os seus ancestrais, que você é a continuação deles! Você não é mais um eu, você é ao mesmo tempo todos os seus ancestrais. Assim, uma única inspiração pode liberar você – uma respiração com esse insight pode liberar você.

Que gentil da sua parte respirar por seu pai, por sua mãe, e relaxar seu corpo. Quando você relaxa seu corpo, o corpo do seu pai e da sua mãe em você também está relaxado. É como um milagre. E você pode ver que transporta todas as gerações de ancestrais em você – aonde quer que você vá, eles vão com você. Quando você dá um passo, em plena consciência, tocando as maravilhas da vida, todos os ancestrais em você estão dando o mesmo passo, ao mesmo tempo. E ao dar um passo assim, com esse tipo de sabedoria, você está livre da noção de eu. Isso é muito curador, muito transformador.

Nós sofremos, sentimos raiva, desespero – porque ainda estamos presos à noção de um eu. Sentimo-nos tão solitários, tão separados. Não tocamos a nossa comunhão.

O ensinamento sobre não-eu não nos diz que não existimos. Você existe sim, de verdade – como uma manifestação, uma manifestação maravilhosa. Corpo, sentimentos, percepções, formações mentais, consciência – rios de continuação. E é um rio maravilhoso. Há uma palavra em Sânscrito, santana (assim como o nome daquela cidade na Califórnia), que significa continuidade. Não há um eu, mas há uma continuidade dos cinco rios, dos cinco skandhas. Sempre mudando – mas há uma continuação. Nós continuamos nosso pai, nós continuamos nossa mãe, nós continuamos nossos ancestrais.

E se olharmos em profundidade o nosso corpo, nossos sentimentos, vemos que somos a continuação também de nossos ancestrais animais, vegetais e minerais. Temos nossos ancestrais humanos, porém eles são os mais jovens dentre todos. Antes de nos tornarmos humanos, fomos animais, plantas e minerais. Então, todos os nossos ancestrais, incluindo minerais, vegetais e animais, ainda estão em nós. Se você for livre, eles serão livres. Se você estiver relaxado, eles estarão relaxados. E para isso você não precisa fazer muita coisa. Precisa apenas inspirar com esse tipo de insight, para liberar-se, e para ajudá-los todos a se liberar. Precisa dar um único passo, com esse insight, para liberar-se e ajuda-los a desfrutar da mesma liberdade também.

Você tem uma semana para ficar em Plum Village, ou você tem três semanas para ficar em Plum Village – cada momento da sua estadia pode ser uma oportunidade para fazer isso, para respirar com insight, para caminhar com insight, para comer com insight. Quando você se alimenta, está alimentando seus ancestrais.

Eu me lembro quando há 20 anos atrás nós tivemos um almoço piquenique em Montreal. Estávamos em um retiro, e naquele dia fomos a um bosque fazer piquenique. Eu estive caminhando pelo bosque, observando. Houve um praticante que se sentou ao pé de uma árvore, para almoçar. Eu disse: Irmão, o que você está fazendo? Ele olhou para mim e disse: Estou dando de comer ao Thây. E eu disse: Muito bem. Porque ele sabia que Thây estava nele, e que comendo daquela maneira ele estaria alimentando o Thây nele. O fato é que, cada vez que comemos, alimentamos nossos ancestrais. Nossos ancestrais continuam a viver porque nós os alimentamos todos os dias. Não só com alimentos comestíveis, mas para o bem estar deles, temos de dar a eles o alimento espiritual.

Então, toda vez que você respira, convide todos os seus ancestrais para respirar com você, e você terá esse insight que tem o poder de libertar, de transformar. Toda vez que você caminhar, convide seus ancestrais para virem com você, e desfrute de cada passo -- de qualquer jeito, eles estarão com você, quer você os convide ou não. Eles estão em você. Mas se você estiver consciente disso, se você mantiver esse insight, você enxergará a verdade.

Por favor, desfrutem de si mesmos, de sua prática, de sua caminhada.


(Tradução de Chân Mật Đăng – Verdadeira Luz Esotérica)
Comente esse texto em
http://sangavirtual.blogspot.com

saiba mais
acesse:
http://www.viverconsciente.com/textos/budismo_e_psicoterapia.htm

quinta-feira, 29 de abril de 2010

O Budismo e o homossexualismo

O Budismo e o homossexualismo
(acesso ao Insight - Budismo Theravada)

1. Há algum tipo de prática sexual rejeitada pelo Budismo?

Em primeiro lugar é necessário fazer a distinção entre os praticantes Budistas que adotam o monasticismo e aqueles que seguem a vida leiga. O código de disciplina monástica prescreve o celibato para os monges e monjas. Para os leigos há um conjunto de cinco preceitos éticos que devem ser observados, sendo que o terceiro preceito determina que a pessoa deve evitar o comportamento sexual impróprio.
Portanto, no caso dos monges (as) qualquer tipo de prática sexual é proibida e estará sujeita a algum tipo de censura e punição que depende da gravidade do ato, sendo que os casos extremos resultam na expulsão da comunidade monástica. No caso dos leigos, determinar se o terceiro preceito está sendo observado ou não é uma situação um pouco mais complexa visto que depende da interpretação do que seria um comportamento sexual impróprio.

2. O que é um comportamento sexual impróprio?

Para entender se um determinado comportamento sexual é impróprio é necessário entender o critério empregado no Budismo para fazer julgamentos éticos.
O Buda recomendou três critérios ao fazermos julgamentos morais. O primeiro podemos chamar de princípio da universalidade – agir em relação aos outros do mesmo modo que gostaríamos que eles agissem conosco. O segundo podemos chamar de princípio conseqüencial – para determinar se um comportamento é benéfico ou prejudicial é necessário avaliar as conseqüências tanto no agente como no paciente, ou seja, um comportamento que cause algum tipo de dano quer seja no agente ou no paciente deve ser evitado. O terceiro podemos chamar de princípio instrumental – um comportamento é benéfico se ele nos conduz para mais perto do objetivo ou prejudicial, se nos afasta dele. O objetivo último no Budismo é nibbana, um estado de pureza e paz mental, e tudo que conduz a esse objetivo será benéfico.
Essa abordagem utilitária em relação à ética fica ainda mais clara ao observarmos que o Buda usava com muito mais freqüência os termos ‘benéfico ou hábil’ e o seu oposto ‘prejudicial ou inábil’ no lugar de bom ou mal. Outro elemento importante na avaliação do comportamento é a intenção. Se uma ação está fundamentada em boas intenções, por exemplo, na generosidade e na compaixão, então, ela será considerada hábil. Portanto, avaliar o comportamento no Budismo requer mais do que simplesmente obedecer a certas regras ou mandamentos, exige que tenhamos plena consciência dos nossos pensamentos, palavras e ações, bem como dos nossos objetivos e aspirações.
Após examinarmos rapidamente os fundamentos racionais da ética Budista podemos melhor compreender que tipo de comportamento sexual o Buda considerava como impróprio ou inábil e porque. Nos discursos o Buda menciona particularmente alguns tipos de comportamento sexual impróprio, como por exemplo o adultério. O adultério é inábil porque requer o subterfúgio e o engano, significa que promessas feitas são rompidas e a confiança é traída.
O homossexualismo não é mencionado de forma explícita em nenhum dos discursos do Buda levando à conclusão de que a homossexualidade deve ser avaliada do mesmo modo que a heterossexualidade. No caso de duas pessoas leigas que agem com base no consentimento mútuo, onde não há adultério, e onde o ato sexual é uma expressão de amor, respeito, lealdade e calor humano, esse seria um comportamento sexual hábil. E o mesmo critério vale se as duas pessoas forem do mesmo sexo. Do mesmo modo, a promiscuidade, libertinagem e a desconsideração dos sentimentos dos outros fazem com que um ato sexual seja inábil quer seja heterossexual ou homossexual. Todos os princípios empregados para avaliar uma relação heterossexual também são válidos para avaliar uma relação homossexual.
No Budismo podemos dizer que não é o objeto do desejo sexual que determina se um ato sexual é inábil ou não, mas na verdade, a qualidade das emoções e intenções envolvidas.

3. Há alguma objeção do Buda com relação ao casamento do mesmo sexo?

A resposta é “Não.” Na coleção de discursos do Buda não há nenhuma objeção desse tipo. Para ser mais exato, o Buda nem apoiava e tampouco se opunha ao casamento entre pessoas do mesmo sexo.

4. Isso então quer dizer que o Budismo é mais tolerante em relação aos homossexuais?

A realidade prática nas sociedades tradicionais Budistas é que não há muito apoio para idéias liberais e os estudos filosóficos das escrituras Budistas têm influencia reduzida na cultura popular. Os direitos humanos nesses países sempre receberam pouca atenção e a cultura está enraizada na interpretação popular da Lei de Karma que tende a ver karma como um processo linear, próximo do fatalismo.
É comum os monges instruírem os discípulos leigos a enxergar o mundo sob uma ótica fatalista, isto é, que cada pessoa nasce para pagar os seus pecados. De acordo com essa interpretação o homossexualismo, bem como as demais práticas sexuais consideradas como depravadas, têm origem no desrespeito ao terceiro preceito em vidas passadas e por isso as pessoas têm de pagar nesta vida por essas ofensas cometidas em vidas passadas. E sendo assim, elas merecem o tratamento que recebem da sociedade. Esse tipo de crença gera um sistema de valores extremamente conservador.
Algumas vezes o Buda aconselhava evitar um certo tipo de comportamento não porque fosse inábil do ponto de vista ético mas porque colocaria a pessoa em divergência com as normas sociais ou porque poderiam sujeitá-la a sanções legais. Nesses casos, o Buda dizia que evitar esse tipo de comportamento livraria a pessoa da ansiedade e embaraço causado pela desaprovação social e o medo de ações punitivas. Em determinadas situações sociais, esse seria o caso em relação à homossexualidade. Nesses casos, o homossexual tem que decidir se irá se submeter àquilo que a sociedade espera ou se irá tentar mudar os valores sociais.


saiba mais
acesse:
http://www.acessoaoinsight.net/arquivo_textos_theravada/abc_budismo.php#homossexualismo

Aborto no Brasil

Aborto no Brasil

José Roberto Goldim

Atualmente no Brasil o aborto é considerado crime, exceto em duas situações: de estupro e de risco de vida materno. A proposta de um Anteprojeto de Lei, que está tramitando no Congresso Nacional, alterando o Código Penal, inclui uma terceira possibilidade quando da constatação anomalias fetais.

Esta situação já vem sendo considerada pela Justiça brasileira, apesar de não estar ainda legislada. Desde 1993, foram concedidos mais de 350 alvarás para realização de aborto em crianças mal formadas, especialmente anencéfalos . Os juízes inicialmente solicitavam que o médico fornecesse um atestado com o diagnóstico da mal formação, além de outros três laudos para confirmação, um outro laudo psiquiátrico sobre o risco potencial da continuidade da gestação e um para a cirurgia. Ao longo deste período estas exigências foram sendo abrandadas.Em algumas solicitações os juízes não aceitaram a justificativa, e não concederam o alvará tendo em vista a falta de amparo legal para a medida. Em 2000 um advogado entrou com uma solicitação de medida liminar para impedir uma autorização de aborto de bebe anencéfalo no Rio de Janeiro. A mesma foi concedida.

Este tema tem sido discutido desde inúmeras perspectivas, variando desde a sua condenação até a sua liberação inclusive descaracterizando-o como aborto, mas denominando o procedimento de antecipação terapêutica de parto.

A nova redação proposta para o Código Penal, altera todos os três itens, é a seguinte:

Exclusão de Ilicitude
Art. 128. Não constitui crime o aborto praticado por médico se:
I - não há outro meio de salvar a vida ou preservar a saúde da gestante; II - a gravidez resulta de violação da liberdade sexual, ou do emprego não consentido de técnica de reprodução assistida;
III - há fundada probabilidade, atestada por dois outros médicos, de o nascituro apresentar graves e irreversíveis anomalias físicas ou mentais.
Parágrafo 1o. Nos casos dos incisos II e III e da segunda parte do inciso I, o aborto deve ser precedido de consentimento da gestante, ou quando menor, incapaz ou impossibilitada de consentir, de seu representante legal, do cônjuge ou de seu companheiro;
Parágrafo 2o. No caso do inciso III, o aborto depende, também, da não oposição justificada do cônjuge ou companheiro.

A nova redação proposta pode dar margem a diferentes interpretações. No inciso I, por exemplo, o que é preservar a saúde da gestante ? No âmbito da Medicina as ações visam, em última análise, a preservação da saúde das pessoas. Qual a justificativa para o aborto, tendo por base um critério tão vago ?
Os itens constantes no inciso II também merecem algumas considerações. Esta violação da liberdade sexual deverá ser denunciada e registrada junto a uma autoridade competente ? O ato médico de abortar o feto será realizado somente com autorização formal por escrito de um juiz ? Como caracterizar o não consentimento de uma técnica de reprodução assistida se a maioria dos profissionais que atuam na área ainda não tem o hábito de obter um consentimento informado de seus pacientes ?
A probabilidade, e não o diagnóstico conclusivo de lesões no feto, pode levar a algumas situações bastante delicadas. Os médicos que o anteprojeto de lei se refere devem ter familiaridade com a área de diagnóstico pré-natal de anomalias fetais ? O critério de grave e irreversível anomalia física ou mental está restrito a condição da criança imediatamente após o parto ou pode ser ampliada para situações que irão ocorrer a longo prazo ? Um exemplo disto pode ser o diagnóstico preditivo de Doença de Huntington em um feto. Este diagnóstico, que irá manifestar-se somente na quarta década de vida, constitui um motivo para a realização do aborto ? Estas e outras questões devem servir de base para uma reflexão adequada sobre a adequação da realização de abortos eugênicos.
Anteprojeto de Lei que altera dispositivos do Código Penal e dá outras providências.

Material de Apoio - Bioética e Reprodução
Página de Abertura - Bioética
Texto incluído em 21/04/98 e atualizado em 2004
(c)Goldim/1998-2004

extraído de:
http://www.ufrgs.br/bioetica/abortobr.htm

A EUTANÁSIA NO DIREITO BRASILEIRO

A EUTANÁSIA NO DIREITO BRASILEIRO
Luiz Flávio Borges D’Urso

Artigo publicado no Diário do Grande ABC no dia 06/04/05

O dramático e comovente desfecho da agonia e morte da norte-americana Terri Schiavo, recentemente - depois de 15 anos em estado vegetativo persistente - reabriu as discussões planetárias sobre o polêmico tema da eutanásia. O caso conquistou repercussão sem paralelos, colocando de um lado, os que apoiavam a decisão do marido de colocar um ponto final ao drama da esposa, e do outro os que acreditavam , como a família de Terri , na chance de uma remota de recuperação.

No calor da polêmica, os debates dividiram-se entre aqueles que defendem e os que repudiam a prática de abreviar uma vida, independentemente dos motivos. Mas há também toda a contextualização histórica e legal dessa decisão, que movimentou a Justiça americana e chegou à presidência dos Estados Unidos, enquanto Terri Schiavo, aos 41 anos, agoniza pela inanição provocada pelo desligamento dos tubos que a mantinha viva.

Muito praticada na antiguidade, por povos primitivos, a eutanásia até hoje encontra seus simpatizantes que, freqüentemente, têm coragem de praticá-la, mas, muito raramente, de defendê-la publicamente ou apontar seus benefícios de forma a convencer a opinião pública, como aconteceu no caso Schiavo. A palavra eutanásia deriva de eu, que significa bem, e thanatos, que é morte, significando boa morte, morte doce, morte sem dor nem sofrimento. As modalidades da eutanásia são três: a libertadora, a piedosa e a morte econômica ou eugênica.
.
Na forma libertadora, o enfermo incurável pede que se lhe abrevie a dolorosa agonia, com uma morte calma, indolor. Já na forma piedosa, o moribundo encontra-se inconsciente e tratando-se de caso terminal que provoca sofrimento agudo, proporcionando horríveis espetáculos, de agonia, seu médico ou seu familiar, movido por piedade, o liberta, provocando a antecipação de sua hora fatal.

Quanto à forma eugênica, trata-se da eliminação daqueles seres apsíquicos e associais absolutos, disgenéticos, monstros de nascimento, idiotas graves, loucos incuráveis e outros. Essa modalidade está presente na lembrança histórica das atrocidades dos nazistas, contra judeus e outras minorias, em prol da apuração da raça ariana.

A eutanásia no Brasil é crime, trata-se de homicídio doloso que, em face da motivação do agente, poderia ser alçado à condição de privilegiado, apenas com a redução da pena. Laborou com acerto o legislador penal brasileiro, não facultando a possibilidade da eutanásia. Ocorre, todavia, que na prática a situação é bem diferente, pois envolve além do aspecto legal, o aspecto médico, sociológico, religioso, antropológico, entre outros.

Por esses problemas é que a eutanásia, embora sendo crime, é praticada impunemente no Brasil. Relatos de pessoas que aplicaram a eutanásia em parentes somam-se a relatos de médicos que a praticaram, sempre todos imbuídos do espírito da “piedade”.Ora, não sejamos hipócritas, pois o que realmente leva à prática da eutanásia não é piedade ou a compaixão, mas sim o propósito mórbido e egoístico de poupar-se ao pungente drama da dor alheia. Somente os indivíduos sujeitos a estados de extrema angústia são capazes do golpe fatal eutanásico, pois o alívio que se busca não é o do enfermo, mas sim o próprio; que ficará livre do “fardo” que se encontra obrigado a “carregar”.

Isto se aplica aos familiares, amigos, médicos, advogados, sociólogos, enfim, a todos aqueles que já pensaram ou defenderam a prática desse crime hediondo, que iguala o homem moderno a seus antepassados bárbaros e primitivos. A falsidade no enfoque desse assunto salta aos olhos, quando nos deparamos a casos concretos envolvendo interesses mundanos, quer de natureza conjugal ou de sucessão patrimonial.

Embora muito remota pelos princípios humanos e cristãos da sociedade, a eutanásia, caso seja legalizada no Brasil, se estará admitindo uma forma de burlar o crime de auxílio ao suicídio pela modalidade libertadora, burlar o homicídio pela modalidade piedosa e finalmente burlar o infanticídio e até o aborto criminoso pela modalidade eugênica ou econômica.

A vida é nosso bem maior, dádiva de Deus. Não pode ser suprimida por decisão de um médico ou de um familiar, qualquer que seja a circunstância, pois o que é incurável hoje, amanhã poderá não sê-lo e uma anomalia irreversível poderá ser reversível na próxima semana.Afinal, se a sociedade brasileira não aceita a pena de morte, é óbvio que esta mesma sociedade não aceita que se disponha da vida de um inocente, para poupar o sofrimento ou as despesas de seus parentes. Enquanto for crime a eutanásia, sua prática deve ser punida exemplarmente.

Luíz Flávio Borges D’Urso - advogado criminalista, mestre e doutor pela USP, é presidente da OAB SP.


saiba mais
acesse:
http://www.oabsp.org.br/palavra_presidente/2005/81/

segunda-feira, 26 de abril de 2010

As Três Jóias

As Três Jóias

A raiz da palavra Buda significa despertar, tomar conhecimento, compreender. E aquele que desperta e compreende é chamado de Buda. Simplesmente isso! A capacidade de despertar, de compreender e amar é chamada de natureza de Buda. Quando os budistas dizem: eu me refugio em Buda, eles estão confiando na sua própria capacidade de compreender, tornar-se despertos. No budismo existem três jóias preciosas: Buda, aquele que está desperto; Dharma, o caminho da compreensão e do amor; Sangha, a comunidade que vive em consciência e harmonia. As três são interligadas, e às vezes é difícil distinguir uma da outra. Todos nós temos a capacidade de despertar, compreender e amar. Assim, em nós mesmos encontramos Buda e também Dharma e Sangha. Buda foi aquele que desenvolveu seu entendimento e amor ao mais alto nível.

Compreensão e amor não são duas coisas, mas uma só. Para desenvolver a compreensão é necessário que se exercite olhar para todos os seres vivos com olhos de compaixão. Quando você compreende, você ama; e quando você ama, age naturalmente, de tal forma que alivia o sofrimento alheio.

Aquele que está desperto, que sabe, que compreende, é chamado de Buda. Ele existe em todos nós. Podemos nos tornar despertos, compreensivos e também amorosos.

Há 2.500 anos atrás existiu uma pessoa que praticou isso de tal forma que seu entendimento e amor tornaram-se perfeitos, e todos no mundo reconheceram isso. Seu nome era Sidarta. Ele era muito jovem ainda quando começou a ver que a vida contém muito sofrimento; que as pessoas não amam umas às outras; não se compreendem suficientemente. Deixou então o seu lar e foi para a floresta praticar meditação, respiração e sorriso. Ele se tornou monge e praticou a fim de desenvolver seu despertar, sua compreensão e amor no mais alto nível.

Quando dizemos: Eu me refugio no Buda, deveríamos entender também: o Buda se refugia em mim; porque sem a segunda parte, a primeira não é completa. Buda necessita de nós para que o despertar, o amor e a compreensão possam se tornar reais e não meros conceitos. Essas coisas devem ter efeitos concretos na vida. Sempre que eu digo: Eu me refugio em Buda, ouço: Buda se refugia em mim. Nossa tarefa é muito importante: realizar o estado desperto, realizar a compaixão, realizar o entendimento.

Todos nós somos Budas, porque só através de nós é que a compreensão e o amor se tornam tangíveis e efetivos.

Buddhakaya em sânscrito significa corpo de Buda. Para o budismo ser real é necessário que haja um buddhakaya, ou seja, uma personificação da atividade desperta. De outra forma o budismo é apenas uma palavra. Shakyamuni Buda era um buddhakaya. Ao realizar o ato de despertar, compreender e amar cada um de nós é buddhakaya.

A Segunda jóia é o Dharma, isto é, o que Buda ensinou. É o caminho da compreensão e amor: como entender, como amar, como transformar essas coisas numa realidade. Antes de morrer, Buda disse aos seus discípulos: "Meus caros, meu corpo físico não estará mais aqui amanhã, mas o corpo do meu ensinamento estará sempre aqui para ajudá-los. Considerem-no como seu mestre, um mestre que jamais se separa de vocês.”

Esse foi o nascimento do Dharmakaya. O Dharma tem um corpo, o corpo dos ensinamentos ou o corpo do Caminho. Dharmakaya significa apenas Os Ensinamentos de Buda, a forma de realizar a compreensão e o amor.

Qualquer coisa pode ajudar a despertar a natureza búdica. Quando estou só e algum pássaro me chama, retorno a mim mesmo, respiro e sorrio e, às vezes, ele volta a me chamar. Então sorrio e respondo: - Já estou ouvindo-o. Não só os sons como também as paisagens podem relembrá-los de retornar a si mesmos. Ao abrir a janela de manhã e ver a luz inundar o ambiente, você pode reconhecer isso como a voz do Dharma, e isso se torna parte do Dharmakaya. Essa é a razão por que as pessoas despertas vêem a manifestação do Dharma em todas as coisas. Num seixo, num bambu, no choro de uma criança, qualquer coisa pode ser a voz do Dharma chamando. Nós devíamos ser capazes de praticar dessa forma.

Um mestre também é parte do Dhamakaya, porque ele ou ela nos ajuda a despertar. Sua aparência, sua forma de viver o dia-a-dia, sua forma de lidar com as pessoas, animais, plantas, nos ajudam a atingir o entendimento e o amor em nossa vida. O Dharmakaya não é expresso só por palavras, por sons. Pode expressar-se simplesmente sendo. Às vezes ajudamos mais quando não fazemos nada do que quando fazemos muito. Chamamos isso de não-ação. Esse é também um dos aspectos do Dharmakaya: sem falar, sem ensinar, apenas sendo.

Sangha é a comunidade que vive consciente e em harmonia. Sanghakaya é um novo termo em sânscrito.

A Sangha também precisa de um corpo. Quando você está com sua família e pratica a respiração e o sorriso, reconhecendo o corpo de Buda em você e em seus filhos, então sua família se torna Sangha. Um amigo, nossos filhos, nosso irmão ou irmã, nosso lar, as árvores do nosso pátio, tudo isso pode ser parte do nosso Sanghakaya.

A prática do budismo, a prática da meditação é para a pessoa se tornar serena, compreensiva e amorosa.

Desta forma trabalhamos pela paz de nossa família, de nossa sociedade. Se olharmos mais de perto, veremos que as Três Jóias são, na verdade, uma. Em cada uma delas as outras duas estão presentes. Em Buda existe o estado búdico, existe o corpo de Buda. Em Buda existe o corpo do Dharma, porque sem este ele não poderia se tornar Buda. Em Buda está o corpo da Sangha, porque ele fez seu jejum junto à árvore Bodhi, a outras árvores e pássaros da região. Num centro de meditação temos um corpo de Sangha, Sanghakaya, porque ali é praticada a compreensão, a compaixão. Assim, o corpo do Dharma, o Caminho e os Ensinamentos estão presentes. Mas os ensinamentos não podem tornar-se uma realidade sem a vida e o corpo nossos. De forma que Buddhakaya também está presente. Se Buda e Dharma não estiverem presentes, não existe Sangha. Sem você, Buda não é uma realidade, mas apenas uma idéia.

Sem você, o Dharma não pode ser praticado. Precisa de alguém para poder ser praticado. A Sangha não pode existir sem cada um de vocês. Por isso, quando dizemos: Eu me refugio em Buda, ouvimos também: Buda se refugia em mim. Eu me refugio no Dharma. O Dharma se refugia em mim. Eu me refugio na Sangha. A Sangha se refugia em mim.

(Retirado do livro "Caminhos para a paz interior" de Thich Nhat Hanh)
Comente esse texto em
http://sangavirtual.blogspot.com

sábado, 24 de abril de 2010

Sexo virtual

Sexo virtual CRP 06/31768-3
Terapeuta Sexual

(Entrevista concedida pelo Psicólogo Pedrosa ao editor da Revista Sexsites, João Marinho)

Sob a óptica da psicologia, que mudanças à prática do sexo virtual trouxe para a sexualidade humana? Seria apenas uma forma de "atualizar" fantasias que, até então, ficavam restritas à mente?
A Internet é uma das mais fantásticas invenções da humanidade. Aproxima às pessoas tornando nosso planeta uma verdadeira aldeia global. O sexo virtual tem um lado saudável e outro prejudicial à saúde emocional do internauta. O lado saudável é que a Internet proporcionou a democratização das informações sobre sexo e sexualidade, o que é muito bom. Aproximou, também, as pessoas por afinidades para que possam se conhecer, através das salas de bate-papo, grupos de discussão etc. Fruto deste contato, as pessoas podem se aproximar objetivando um relacionamento com ligação amorosa ou só praticar o sexo virtual ou real. Esta relação pode se fortalecer e surgir até um casamento. Este padrão, ainda, é raro através da Internet. A maioria das relações surgida na Web é superficial e passageira. O sexo puramente virtual através de salas de bate-papo, web camera etc. onde as pessoas se excitam sexualmente para atingirem o orgasmo, é uma forma de estimulação sexual. No passado, quando não existia a Internet, a moçada se estimulava sexualmente vendo vídeos ou revistas eróticas. Na Internet esta estimulação fica mais interessante, pois temos a visão, a audição e a escrita. Mais elementos para estimulação sexual. Vejo isto como algo saudável. O sexo virtual trouxe novas possibilidades para se desenvolver a sexualidade e colocar em prática às fantasias sexuais. O lado prejudicial à saúde emocional do internauta é quando ele fixa o padrão de só obter a estimulação sexual através da Internet e não procura um relacionamento real, seja via Internet ou fora dela. Agindo assim, esta pessoa demonstra que tem algum desequilíbrio emocional.

Em uma recente matéria que fiz sobre infidelidade, um corpo de detetives me informou que a Internet é hoje a principal causa de separações e divórcios, já que é uma ferramenta incrível para achar parceiro sexual e possibilitar uma traição. Em sua visão, como psicólogo, existe um potencial próprio da Internet em propiciar essa "vontade de trair" ou se trata apenas de facilitar a realização de uma vontade que já existia?
A Internet facilita a chamada traição sim, pois coloca às pessoas em contato de forma rápida. Aqui, existem duas questões: pessoas que estão muito bem casadas, gostam da sua parceira, mas entram na Internet para se distrair e relaxar, pois os salas de bate-papo, também, tem a função de lazer. A pessoa relaxa quando tecla e o assunto é sexo. A outra questão é quando o relacionamento já se encontra desgastado e a pessoa usa à Internet como mais um recurso para procurar outra parceria sexual. Então, o problema não é a Internet, mas sim o relacionamento ou casamento desgastado. Quando não existia a Internet as pessoas, também, traíam e utilizavam outros recursos: anúncio em jornal, telefone, paquera na rua, shopping center etc.

Você já tratou, em seu consultório, de algum paciente com problemas de ordem psicológica e sexual relacionados a Web? Qual era o problema? A Internet tem criado uma nova demanda nesse sentido?
Sim, são clientes que apresentam algum tipo de transtorno de personalidade. Tenho atendido alguns casos de internautas que sofrem do Transtorno da Personalidade Obsessivo-compulsiva. Este transtorno se caracteriza por uma obsessão por determinada prática – sexo através da Internet – e a repetição desta prática. É algo que provoca sofrimento, porque o cliente fica horas a fio na rede se masturbando e se estimulando sexualmente. Esta prática traz prejuízo emocional ao cliente, pois ele perde o contato com o mundo real, ficando isolado socialmente.

Qual a sua visão a respeito do chamado sexo virtual, pessoa que "transam" por meio de um bate-papo ou aplicativo de mensagens instantâneas. É saudável e interessante? Há repercussões nos relacionamentos com outras pessoas, especialmente se há um namoro "real" com alguém?
É saudável deste que não se torne uma prática repetitiva e exclusiva. Com relação à pessoa que namora e procura outros relacionamentos na Web, significa que este namoro não é muito firme. Se você estiver ligado verdadeiramente ao parceiro(a) e seu relacionamento é harmonioso e equilibrado, não haverá necessidade de você procurar alguém na Internet. Se há o desgaste, aí sim, você procurará outras pessoas não só na Internet, mas na escola, no trabalho, na rua etc.

Afinal, sexo virtual é traição?
Traição é algo muito relativo, depende da visão de cada um, formação religiosa etc. Pensar em fazer sexo com outra pessoa, que não seja o(a) parceiro(a), é traição? Para alguns sim, para outros não. Alguns dos meus clientes defendem a idéia que o sexo virtual não é traição, só é traição o sexo real. O sexo virtual seria uma brincadeira. Outros acham que o sexo virtual é traição, assim como o real.

É possível, psicologicamente falando, manter uma relação unicamente on-line? Apaixonar-se por uma pessoa sem nunca tê-la visto ou tocado, por exemplo?
Sim, é possível. Se este padrão não desemboca para algo real se torna muito perigoso, pois fica só no campo da fantasia e imaginação, podendo haver prejuízo psicológico. Alguns perdem contato com o mundo real e podem desenvolver algum tipo de desequilíbrio emocional sério.

Na sua opinião, a Internet pode ser uma ferramenta efetiva para uma vida sexual satisfatória? Por quê e em quais condições?
O princípio é o seguinte: o sexo virtual serve para aproximar pessoas e o sexo real para consolidar ou não um relacionamento, amoroso e/ou sexual destas pessoas. Dentro deste princípio, é possível compreendermos a Internet como uma ferramenta efetiva para uma vida sexual satisfatória.

Como profissional, que dicas você daria para que a Internet seja uma fonte de prazer e bem-estar, e não de frustrações?
Utilize a Internet para conhecer pessoas, fazer novas amizades e se estimular sexualmente. Mas, nunca esqueça do seu mundo real e tenha cuidado para não se afastar dele. Ficar só no virtual é frustrante e não faz bem ao seu organismo.

saiba mais
acesse:
http://www.syntony.com.br/artigos_terapia_sexual.asp?artMes=dez2004b_sexo_virtual.asp

sexta-feira, 23 de abril de 2010

Rissho Ankoku Ron

"Rissho Ankoku Ron" - Tratado sobre o Estabelecimento do Ensino Correto no País
O "Rissho Ankoku Ron" representa uma das cinco grandes obras de Nichiren Shonin. Ele escreveu e apresentou-o ao Shogunato Kamakura, em 1261. O manuscrito original do Rissho Ankoku Ron ainda está preservado no templo Hokekyoji de Nakayama, em Chiba, no Japão. Vejamos o que Nichiren Shonin nos ensina através deste trabalho.


MOTIVO

Porque Nichiren Shonin escreveu o Rissho Ankoku Ron?
Segundo o "Ankoku Ron Okugaki", um pós-escrito do Rissho Ankoku Ron, Nichiren Shonin nota que ele começou a escrever o Rissho Ankoku Ron depois de enfrentar um grave terremoto cerca de nove horas da noite do vigésimo terceiro dia do oitavo mês do primeiro ano da Era Shoka (1257). Muitos desastres, como o grande terremoto, um grande incêndio, ventos extremamente fortes, fome e peste, ocorreram na década de 1250. Em seu tratado, Nichiren Shonin descreve fenômenos estranhos no céu, na terra calamidades naturais, epidemias e fome, que nos últimos anos, se espalharam por todo Japão. Bois e cavalos repousavam mortos em cruzamentos e as ruas estavam cheias de esqueletos. Muitos perderam suas vidas e os sobreviventes sofreram muito por estas catástrofes. A maioria da população pereceu e todos foram atingidos com a dor. O Shogunato ordenou aos templos budistas e aos Santuários Xintoístas para rezar para a recuperação. No entanto, não houve qualquer sinal de melhoria. Nichiren Shonin estava alarmado com a situação difícil, e se dirigiu para a biblioteca do templo Jissoji em Iwamoto para investigar as causas dessas calamidades e procurar uma solução. Ele tentou encontrar uma resposta nos ensinamentos budistas. Ele leu todos os sutras de novo e procurado uma resposta em termos de Buda Dhama, em termos da razão, e em termos do próprio curso dos acontecimentos. O ponto culminante deste esforço foi a escrita do Rissho Ankoku Ron.


TEMA

O título, 'Ankoku Ron Rissho', por si só, expressa o seu conteúdo e seus fins claramente. "Rissho” significa estabelecer o ensino correto, acreditar no Sutra do Lótus, o mais maravilhoso ensinamento do Buda. “Ankoku" refere-se a orientar o Japão e todos os países a prosseguir o caminho para a paz através da criação de um mundo de Buda. Ele não visa apenas proteger países, mas torná-los pacíficos (sem lutar), e trazer tranqüilidade espiritual. "Rissho Ankoku” carrega significados religiosos adicionais. "Rissho Ankoku” articula a vontade de Nichiren Shonin de fazer deste mundo, o mundo do Buda, com fé no Sutra do Lótus. O conteúdo do Rissho Ankoku Ron inclui dez perguntas e respostas entre um viajante e um mestre. A resposta à pergunta 9 diz: "Reforme rapidamente os princípios que você sustenta em seu coração e abrace o verdadeiro Veículo Único. Então o mundo triplo tornar-se-á a terra do Buda e como poderia a terra do Buda decair? As regiões nas dez direções irão se tornar terras do tesouro e como poderá uma terra do tesouro sofrer um dano? Se você vive num país que nunca entra em declínio, em uma terra que nunca sofre danos então o seu corpo estará a salvo e o seu coração tranqüilo. Acredite em minhas palavras, tenha atenção ao que eu digo."


INFLUÊNCIA

Desde que Nichiren Shonin apresentou o Rissho Ankoku Ron ao Shogunato, ele foi forçado a viver uma vida de privações. Sua oposição resultou em exílio por altos funcionários duas vezes e ataques por seguidores de outras religiões. No entanto, ele continuou a espalhar o Sutra do Lótus, correndo o risco de comprometer a sua própria vida. Como o Sutra do Lótus afirma, "Eles falam mal de nós, ou nos olham com desdém, ou conduzem-nos para fora dos mosteiros ao longo do tempo", Nichiren Shonin foi incentivado a colocar em prática o Sutra do Lótus com mais convicção. Neste sentido, podemos assumir que a vida de Nichiren Shonin como um praticante do Sutra do Lótus começou e terminou com o Rissho Ankoku Ron.


SIGNIFICADO DO "RISSHO ANKOKU RON” NA IDADE MODERNA

Conflitos abundam em todo o mundo hoje. Eles nos entristecem. Sabemos que existem muitas causas atrás de cada situação e estes problemas não são tão simples como eles aparecem. Por exemplo, podem ocorrer problemas em coisas como a política, raça, religião, ou recursos naturais. Lamentamos que uma das muitas questões seja a religião. Religião deve levar as pessoas à felicidade. Por que nós devemos lutar contra um outro, pondo em risco a vida de todos, por causa da religião? Faz-nos perguntar sobre a finalidade da religião. Em resposta à pergunta 8 do Rissho Ankoku Ron, Nichiren Shonin instrui: "Pare de dar oferendas para os sacerdotes maus que difamam o Verdadeiro Darma, colocando toda a fé de uma vez nos defensores do Verdadeiro Darma." Sentimos que esta ensino pode oferecer uma resposta para o problema que acabamos de mencionar. Em parte alguma do Rissho Ankoku Ron há uma menção de machucar alguém se os seus inimigos não são crentes ou mesmo caluniadores do Sutra do Lótus. Pelo contrário, a Rissho Ankoku Ron nos incentiva a enfrentar problemas com calma, dando um exemplo, sugerindo que este é o caminho que devemos seguir, mesmo na idade moderna. Temos de diminuir eventuais conflitos com o nome de religião e alcançar um mundo pacífico. Budistas, ao longo da história, nunca tentaram atacar alguém com o nome do Buda. Poucas religiões pode afirmar isso. Neste sentido, o budismo é uma religião maravilhosa. Somos instados a manter e proteger os seus profundos ensinamentos e belas tradições. E, somos alertados para isso sempre que lemos o Rissho Ankoku Ron. A simples manutenção do "Rissho Ankoku Ron", no entanto, não é suficiente; é importante ativá-lo em nossas mentes e corpos, para pensar e praticar o Sutra do Lótus, o mais central ensinamento de Buda, a fim de reforçar e criar um mundo do Buda .

saiba mais
acesse:
http://escolanichiren.blogspot.com/2008/12/rissho-ankoku-ron-tratado-sobre-o.html

Projeto Maitréia

Projeto Maitréia
Uma Mensagem de Bondade Amorosa e Paz

Nós vivemos em tempos incertos. A humanidade e todos os seres vivos estão constantemente ameaçados e há urgência na criação das causas para a harmonia em todo o mundo. Todas as grandes religiões e tradições humanitárias ensinam valores como a tolerância, a paciência, a bondade amorosa e a compaixão. Assim que estes valores universais forem adotados e enraizarem-se nas mentes e corações de um número cada vez maior de pessoas, a paz mundial será possível..

Kushinagar, Uttar Pradesh, India

O Projeto Maitréia está baseado na crença de que a paz interior e a paz exterior mantêm uma relação de causa e efeito, e que a bondade amorosa leva à paz qualquer nível da sociedade: os indivíduos, as famílias, as comunidades e o mundo.

A estátua do Buda Maitréia foi projetada para durar no mínimo mil anos. Durante este novo milênio inteiro e até o próximo, ela poderá causar mudanças positivas nos corações e mentes de pessoas em todo o mundo e poderá beneficiar o povo da Índia através de suas atividades econômicas e sociais.

O Projeto Maitréia prevê a construção de escolas que enfatizarão o desenvolvimento ético e espiritual tanto quanto os resultados acadêmicos. Um centro médico atuará em torno de um hospital universitário de padrões internacionais, desenvolvendo programas de saúde, principalmente, para os mais necessitados.

O Projeto Maitréia está trabalhando com o governo local, regional e estadual em Uttar Pradesh, na Índia. A Autoridade de Desenvolvimento Especial de Kushinagar vai dar suporte ao desenvolvimento previsto para a área que circunda o Projeto.

A estátua do Buda Maitréia está sendo construída para gerar o maior benefício possível, pelo maior tempo possível, de modo que a bondade amorosa acabe por florescer no coração de todos os seres.


"A Paz Mundial deve se desenvolver a partir da paz interior. Paz não significa ausência de violência. Paz é a manifestação da compaixão humana."
— Sua Santidade o Dalai Lama


saiba mais
acesse:
http://www.maitreyaproject.org/pt/index.html

quinta-feira, 22 de abril de 2010

Esvazia-te

Esvazia-te

O indivíduo não pode receber dádivas dos céus enquanto suas mãos estiverem ocupadas em reter coisas materiais.

Esvazia-te, esvazia-te para que encontres as verdadeiras riquezas. A eternidade é conhecida por aquele que não planeja, não alimenta recordações nem se preocupa com o amanhã.

Para muitos é difícil reconhecer a necessidade de desligar-se de laços, de afetos e das coisas que os enlevam. Porém, como pode o Ilimitado ser contido num ser que não se entrega ao infinito?

A energia cósmica é a energia pura, renovadora, origem das emanações que vitalizam a Criação. O seu fluxo através de um ser depende de quanto ele poderá deixar que essa energia o permeie sem desviá-la segundo as próprias tendências. Mesmo que se aspire a não interferir nesse fluxo, é inevitável fazê-lo quando existem vínculos em níveis humanos. Por isso, a potência energética acessível a um homem comum, atado à matéria, é consideravelmente menor do que a disponível a um ser desapegado, evoluído espiritualmente.

O contato com a energia divina não pode ser transmitido e tampouco ensinado. Cada contato é único, pois a perfeição jamais se repete. Pode-se falar a respeito dessa energia, pode-se lançar luz no caminho para alcançá-la, mas cada indivíduo tem de percorrer por si mesmo suas trilhas, aprender a não se impressionar com as pedras pontiagudas espalhadas por elas e a comungar da inefável beleza de suas alamedas.

Extraído do livro “O Visitante (O caminho para Anu Tea)”, de Trigueirinho – Págs. 67 a 68 – Editora Pensamento.

saiba mais
acesse:
http://www.trigueirinho.org.br/textos/php/esvazia_te.php

Alterações do Pensamento

Psicopatologia
Alterações do Pensamento

Incluído em 16/02/2005

Trata-se, o pensamento, de uma operação mental que nos permite aproveitar os conhecimentos adquiridos na da vida social e cultural, combiná-los logicamente e alcançar uma outra nova forma de conhecimento. Todo esse processo começa com a sensação e termina com o raciocínio dialético, onde uma idéia se associa a outra e, desta união de idéias nasce um a terceira.

Quando percebemos uma rosa branca concebemos, ao mesmo tempo, as noções de rosa e brancura, daí, conceberemos uma terceira idéia que combina as duas primeiras. Evidentemente, para concebermos as duas primeiras idéias há a necessidade de que, anteriormente, tenhamos de experimentar a rosa e também o branco para, numa próxima operação concebermos a rosa branca.

Não há, desta forma, necessidade de termos experimentado uma rosa já branca, assim como, por exemplo, somos capazes de conceber uma rosa completamente verde, sem que, sequer, a tenhamos visto.

O raciocínio humano é uma cadeia infinita de representações, conceitos e juízos, sendo a fonte inicial de todo esse processo a experiência sensorial. Nosso conhecimento se dá através das representações sensoperceptivas do mundo e delas, elaboramos nossos conceitos, vistos anteriormente. O pensamento lógico consiste em selecionar e orientar esses conceitos, tendo como objetivo alcançar uma integração significativa, que possibilite uma atitude racional ante as necessidades do momento.

Pensamento e Juízo
Chama-se juízo o processo que conduz ao estabelecimento dessas relações significativas entre conceitos e, julgar é, nesse caso, estabelecer uma relação entre conceitos. A função que relaciona os juízos, uns com os outros, recebe a denominação de raciocínio. Em seu sentido lógico, o raciocínio não é nem verdadeiro nem falso, ele será sim, correto ou incorreto. Portanto, o raciocínio para ser correto deve ser lógico e, em Psicologia, o termo raciocínio tem o mesmo sentido de pensamento.

Por outro lado, devemos completar a idéia de que o pensamento não se resume em associações esparsas e aleatórias, como se combinássemos peças para formação de um mosaico. Devemos acrescentar à teoria associativa um algo mais que confere ao pensamento uma característica formal, ou seja, uma capacidade em conseguir dar FORMA às idéias e que, estas, não são apenas a soma de suas partes, mas sim, uma configuração independente. Isso pode ser exemplificado pela observação de que uma melodia não se constitui apenas na somatória de suas notas: trata-se de uma coisa nova, com uma forma independente e original.

Idéias Supervalorizadas
Há situações onde ocorre uma predominância dos afetos sobre a reflexão consciente, com subseqüente alteração do juízo da realidade e com repercussões secundárias no comportamento social do indivíduo. As Idéias Supervalorizadas são conhecidas também como Idéias Prevalentes ou Idéias Superestimadas. É quando o pensamento se centraliza obsessivamente num tópico especialmente definido e carregado de uma enorme carga afetiva.

A imagem literária através da qual se estigmatiza o possuidor das Idéias Supervalorizadas é a do indivíduo fanatizado, cuja convicção acerca de sua Idéia Superestimada desafia toda argumentação em sentido contrário, inclusive a contra-argumentação embasada em elementos lógicos e razoáveis.

Tendo em vista a grande força sentimental propulsora da convicção prevalente, tal pensamento passa a ser dirigido exclusivamente pela emoção, comumente por uma emoção doentia e com total descaso para com a lógica ou para com a razão. A necessidade íntima convocada por este psiquismo problemático pode encontrar algum conforto na adoção de uma crença; seja ela política, religiosa, filosófica ou artística, de tal forma que o indivíduo se encontra cego para todas as evidências que não compactuem com sua idéia prevalente.

Tudo aquilo que possa comprometer ou ameaçar o valor e o significado atribuído à Idéia Supervalorizada é recusado pela consciência e, quanto mais a realidade dos fatos sugerir conclusões contrárias à tais pensamentos, mais claramente perceberemos a sua não-normalidade.

Forma do Pensamento
Havendo saúde mental os estímulos para que o raciocínio se desenvolva devem provir de fontes externas e internas. Mas o pensamento não é guiado apenas por considerações estritamente atreladas à realidade, ele também flui motivado por estímulos interiores, abstratos e afetivos ou até instintivos. A criação humana, por exemplo, ultrapassa muitas vezes a realidade dos fatos, refletindo estados interiores variados e de enorme valor para a construção de nosso patrimônio cultural.

Voltar-se para o mundo interno significa que o pensamento se manifesta sob a forma de DEVANEIOS - uma espécie de servidão das idéias às nossas necessidades mais íntimas, aos nossos afetos e paixões. Enquanto há saúde mental, entretanto, nossos devaneios são sempre voluntários e reversíveis; eles devem ser nossos servos e não nossos senhores.

Em estados mais doentios, esses devaneios ou fugas da realidade são emancipados da vontade, são impostas ao indivíduo de forma absoluta e tirânica. Parece tratar-se de um indivíduo que despreza a realidade e vive uma realidade nova que lhe foi imposta involuntariamente, da qual não consegue libertar-se.

A própria concepção da realidade pode sofrer alterações nos transtornos psíquicos. Em determinados estados neuropsicológicos a realidade pode sofrer alterações de natureza bioquímica, funcional ou anatômica. Em outros estados, agora de natureza psicopatológica, os elementos da realidade também podem ser deturpados por fatores afetivos, emocionais ou psíquicos, de forma a prevalecer uma concepção do mundo determinada exclusivamente pelo interior de ser e não mais pela lógica comum à todos nós.
Ao pensamento que se afasta da realidade morbidamente, ou seja, doentiamente, damos o nome de Pensamento Derreísta ou Pensamento Autista. Falamos “se afasta morbidamente da realidade” porque esse tipo de pensamento não mais depende do arbítrio que todos temos em fantasiar e voltar à realidade voluntariamente. Ele devaneia obrigatoriamente, sendo negado ao paciente a faculdade de entendimento dos limites de nossas fantasias, quando nos imaginamos ganhadores da loteria ou coisas assim, e da realidade, com a consciência plena de nossa situação.
Visto assim, normal seria a dupla capacidade do pensamento, tanto para lidar com a fantasia, quanto para lidar com o concreto, de maneira livre e autônoma. O ser humano normal deve ter autonomia e capacidade de passar voluntariamente de uma forma à outra e, principalmente, deve saber claramente onde começa um tipo de pensamento e termina o outro.

Para aqueles que acreditam ser normal e até desejável que a pessoa tenha seus pensamentos exclusivamente atrelados ao concreto e ao real, lembramos que essa limitação imposta ao pensamento, fazendo-o incapaz de afastar-se do absolutamente concreto, leva o nome de Concretismo, que também é uma alteração da forma do pensamento.

Pensamento Derreísta
O Pensamento Derreista é aquele que se desvia da razão, faltando-lhe tenacidade para se atrelar à realidade. Sua característica principal e criar, a partir de antigas cognições e novas representações, um mundo novo e de acordo com os desejos, anseios e angústias.

Bleuler deixou explícito que nos casos de esquizofrenia o pensar se encontra profundamente alterado. O voltar-se para o mundo interno contribui para que o pensamento se manifeste sob a forma de devaneio, quando a pessoa pode deixar suas fantasias em total liberdade, de rédeas soltas. Em tais circunstâncias, o pensar não obedece às leis da lógica e, nos casos mais acentuados, tudo transcorre como se o indivíduo estivesse submerso num verdadeiro estado onírico. Para Bleuler, o Pensamento Derreísta obedece às suas próprias leis e utiliza as relações lógicas habituais apenas na medida em que são convenientes mas, de qualquer forma, ele não se acha ligado de nenhuma maneira a essas leis lógicas. O Pensamento Derreísta está dirigido pelas necessidades íntimas do paciente, o qual pensa mediante símbolos, analogias, conceitos fragmentários e vinculações acidentais.

Ao contrário do Pensamento Derreísta temos o Pensamenso Realista. A clínica nos mostra claramente que essas duas formas de pensar podem coexistir justapostas num mesmo paciente. Ao lado das marcantes alterações derreísticas, realisticamente os pacientes podem se orientar perfeitamente bem no tempo e no espaço, podem ter suas ações perfeitamente adequadas e se adaptam à alguma parte de sua realidade pragmática, podendo nos parecer normais em muitas circunstâncias.

Pensamento Realista
O Pensamento Realista é aquele que consegue compatibilizar com naturalidade, ou seja, fisiologicamente, tanto a parte formal do raciocínio, quanto a parte mágica natural à todo ser humano, ou seja, tanto o raciocínio orientado pela lógica, quanto os devaneios espiritualizados e sublimes do ser humano. Essa harmonia entre a lógica e o mágico, desejável no ser humano normal, recomenda o ditado de que "não importa se a aventura é louca, desde que o aventureiro seja lúcido".

No território do pensamento mágico abrigamos todas nossas crenças, nossas paixões, nossas superstições, enfim, nosso mundo da fantasia e da magia. No território do pensamento formal e lógico, habitam os conceitos, as suposições, as deduções, as induções, as idéias racionalizadas e, principalmente, a noção exata para valorizarmos adequadamente nosso próprio lado mágico. Veja ao lado o Concretismo, que é um exagero do Pensamento Realista.

CURSO DO PENSAMENTO
Inibição do Pensamento
Pelo curso do pensamento podemos ver, inicialmente, seu ritmo. Quanto à isto, o pensamento pode manifestar-se normal, rápido ou lento. Em seu ritmo lento temos a Inibição do Pensamento. A inibição do pensamento é um sintoma que se manifesta por lentidão de todos os processos psíquicos. Nos enfermos em que existe inibição do pensamento, observa-se também grande dificuldade na percepção dos estímulos sensoriais, limitação do número de representações e lentidão no processo e evocação das lembranças.

Os pacientes com inibição do pensamento mantêm-se apáticos, não falam espontaneamente nem respondem às perguntas com vivacidade, respondem lentamente ou com dificuldade. A perturbação é também qualitativa ou seja, atinge a essência do pensamento e se acompanha, geralmente, de um sentimento subjetivo de incapacidade. Junto com inibição do pensamento pode haver ainda sentimento de pouco interesse, de imprecisão a respeito das opiniões, dificuldades para a escrita e lentidão para andar. Esses pacientes revelam dificuldade de compreensão, de iniciar uma conversação, de escolher palavras, enfim, eles pensam com grande esforço.

Fuga de Idéias
A Fuga de Idéias é uma alteração da expressão do pensamento caracterizada por uma variação incessante do tema e uma dificuldade importante para se chegar a uma conclusão . A progressão do pensamento encontra-se seriamente comprometida por uma aceleração associativa, a tal ponto que, a idéia em curso é sempre perturbada por uma nova idéia que se forma. Segundo Bleuler, na Fuga de Idéias os doentes geralmente são desviados da representação do objetivo através de quaisquer idéias secundárias. Assim, no pensamento com Fuga de Idéias, o que há não é uma carência de objetivos mas uma mudança constante do objetivo devido a extraordinária velocidade no fluxo das idéias.

A sucessão de novas idéias, sem que haja conclusão da primeira, torna o discurso pouco ou nada inteligível. Há, pois, passagem de um assunto para outro sem que o primeiro tenha chegado ao fim: "eu não gosto de batatas, mas acho que em São Paulo o clima é melhor. Porque o senhor não compra um carro novo ?"

Normalmente costumamos observar 4 características na Fuga de Idéias:
1. Desordem e falta aparente de finalidade das operações intelectuais: mesmo quando há certa relação entre os conceitos, o conjunto carece de sentido e de significado;
2. Predomínio de associações disparatados;
3. Distraibilidade. Facilidade de se desviar do curso do pensamento sob a influência dos estímulos exteriores;
4. Freqüente aceleração do ritmo da expressão verbal.

O paciente com fuga de idéias é incapaz de concentrar sua atenção, dispersando-se numa multiplicidade de estímulos sensoriais sem se aprofundar em nada. A Fuga de Idéias normalmente está associada a aceleração do psiquismo, ou TAQUIPSIQUISMO: um estado afetivo comumente encontrado na hipomania ou mania, ou seja, na euforia. Seria como se a eloqüência na produção de idéias superasse a capacidade de verbalizá-las. Diz-se LOGORRÉIA ou VERBORRAGIA para o fenômeno de produção aumentada de palavras, o qual, pode ser ou não acompanhada de Fuga de Idéias.

Na prática psiquiátrica o observador pode ter a falsa impressão de que o paciente verborrágico (com ou sem Fuga de Idéias) tem uma crítica aumentada e arguta. Entretanto, ainda que seja capaz de observações perspicazes e ferinas, isso se deve à perda da inibição social que normalmente acompanha os estados maníacos e, de fato, o que se vê é mais uma atitude de inconveniência do que um juízo crítico apurado. O homem sadio não diz muitas coisas que poderiam ser ditas porque, em certas ocasiões e circunstâncias alguns comentários não são recomendados pela ética. Tais considerações não existem nos pacientes eufóricos.

Bloqueio ou Interceptação do Pensamento
Nesses casos há uma interrupção brusca da idéia em curso e o fluxo do pensamento fica bloqueado, cessando repentinamente. É como se, durante uma exposição discursiva, um raio caísse bem próximo da pessoa que fala e, pelo susto, interrompesse imediatamente a exposição. Depois do susto normalmente existe a pergunta: " o que estava mesmo dizendo?" e, em seguida, pode retomar a idéia inicial. Isso é um bloqueio ou interceptação do pensamento.

Normalmente o bloqueio sugere uma espécie de força interior que supera a intenção de concluir o tema por alguns instantes; trata-se de uma motivação interna bloqueadora do curso do pensamento. Podemos encontrar bloqueios relacionados a fortes emoções mesmo na vida psíquica normal. Nos estados patológicos as forças interiores (complexos, delírios, paixões) produzem boas razões para os bloqueios. Nesses casos, havendo uma interrupção da idéia em curso haverá, conseqüentemente, uma interrupção do discurso.

Na esquizofrenia observa-se com freqüência o aparecimento inesperado de interceptação das idéias. O doente começa a expor um assunto qualquer e, subitamente, se detém. As vezes, depois de alguns instantes, volta a completar o pensamento interrompido, outras vezes, inicia um ciclo de pensamento completamente diferente.

Perseveração
É a repetição continuada e anormalmente persistente na exposição de uma idéia. Existe uma aderência persistente de um determinado pensamento numa espécie de ruminação mental, como se faltasse ao paciente a formação de novas representações na consciência. Percebemos que há uma grande dificuldade em desenvolver um raciocínio, seja por simples falta de palavras, por escassez de idéias ou dificuldade de coordenação mental. Por definição a Perseveração do Pensamento é a repetição automática e freqüente de representações, predominantemente verbais e motoras, que são evocadas como material supérfluo nos casos em que existe um déficit na evocação de novos elementos ideológicos.
A Perseveração está incluída nos distúrbios do curso do pensamento por sugerir que a temática em pauta se encontra limitada a um curso circular, que não tem fim e repete-se seguidamente. Havia um paciente epiléptico que dizia: "então a minha mãe corria atrás da gente com uma faca, aí eu ia buscar a Genizinha que sabia benzer ela, então chegava e benzia e minha mãe corria atrás da gente com uma faca, aí eu ia buscar a Genizinha que sabia benzer ela, então chegava e benzia minha mãe que corria atrás da gente..."

Observamos Perseveração do Pensamento em alguns casos de agudização psicótica, nos quais há significativa desestruturação da consciência e um determinado estímulo interno passa a se assenhorear de toda personalidade naquele momento. Também observamos em determinados Estados Crepusculares, onde, patologicamente há um significativo estreitamento da consciência.

Circunstancialidade ou Prolixidade
Aqui, o paciente revela uma incapacidade irritante para selecionar as representações essenciais daquelas acessórias, ou seja, o pensamento foge da pauta principal e perde-se no detalhamento trivial. Aparece um grande rodeio em torno do tema central, uma riqueza aborrecedora de detalhes e circunstâncias sem propósitos práticos e pormenores desnecessários, tornando o discurso bem pouco agradável. À esta situação chamamos de VISCOSIDADE ou discurso Viscoso ou, quando esta é uma das características constante da pessoa, pode-se chamá-la de pessoa Viscosa. Um exemplo contundente de viscosidade é a conversa ou a atitude de alguns bêbados, muito inconvenientes e dos quais não é fácil se livrar.

Na Circunstancialidade aparece, como é natural, um certo grau de ansiedade por parte do interlocutor, provocada pela morosidade na conclusão da idéia. Um paciente, perguntado se tinha ido fazer uma tomografia, cuja resposta deveria ser algo como sim ou não, dizia: " bem, tive que ir terça feira passada porque o movimento do escritório às terças é menor; na segunda feira é que tem mais serviço, porque o pessoal deixa tudo para ser resolvido às segundas. Até que foi bom eu ter deixado para a terça, porque, lá no serviço do tomógrafo, eles também devem ter mais movimento de segunda, que por sinal é um dia terrível. Acho que (brincando) a semana deveria começar pela terça".

A Prolixidade produz um curso do pensamento muito tortuoso e o tema central fica seriamente prejudicado pelas divagações inúteis e pelos comentários paralelos. Em seu diálogo o paciente viscoso tem sempre algo a acrescentar e de tal forma que o fim da conversa fica desagradavelmente comprometido. No consultório ele é capaz de levantar-se muitas vezes antes de ir embora e sentar novamente para acrescentar mais alguma coisa, absolutamente sem importância.

Incoerência
Na Incoerência há uma grande desorganização na estrutura sintática com períodos em branco e frases soltas no meio da exposição de uma idéia. Freqüentemente a Incoerência está associada a transtornos que comprometem o estado da consciência. É como se faltasse ao paciente condições homeostáticas para a organização das idéias e para sua capacidade de comunicação verbal. O Estado Crepuscular é um bom exemplo de Distúrbio da Consciência, onde a capacidade de organização do pensamento encontra-se seriamente comprometido. Também na Turvação da Consciência pode haver Incoerência.

O pensamento incoerente é confuso, contraditório e ilógico. Enquanto na Fuga de Idéias percebemos a passagem repentina de uma idéia para outra, na Incoerência o que interrompe o curso do pensamento são fragmentos soltos de idéias aleatórias; como se o pensamento estivesse pulverizado.

Conteúdo do Pensamento
Além dos Distúrbios da Forma e dos Distúrbios do Curso do Pensamento, elementos valiosíssimos na propedêutica psíquica, devemos verificar também os Distúrbios do Conteúdo do Pensamento. Este conjunto sintomático completará esta grande área do psiquismo a ser pesquisada, o Pensamento. Para a elaboração do diagnóstico psiquiátrico será necessário, além do Pensamento, também a verificação de duas outras grandes áreas; a Afetividade e o Comportamento.

O exame do Conteúdo do Pensamento mostra-nos a essência do ser, o elemento mais refinado e sublime da pessoa e aquilo que ela tem de mais íntimo dentro de si. A dificílima tarefa de avaliação do conteúdo do pensamento remete-nos a um dos campos mais polêmicos da argüição do ser humano: a valoração de suas idéias.

Entre o examinador e o examinado vibram as mais variadas tendências culturais, as mais diversas inclinações filosóficas, todas as sutilezas da ética, da moral e da religião, deparam-se ainda, a tonalidade afetiva e a natureza dos sentimentos pessoais de cada um. Portanto, julgar idéias é sinônimo de julgar pessoas, uma atitude tão incrível quanto julgar a arte, tão espinhosa quanto definir a beleza. O bizarro e o majestoso saltam logo aos olhos, mas entre um e outro há uma infindável variação de nuances entre o sadio e o patológico.

Examinando o Conteúdo do Pensamento estaremos tocando o cerne da personalidade, o miolo do ser psíquico e o resultado final em que o indivíduo se encontra neste dado momento. O Conteúdo do Pensamento comporta todo perfil dos conceitos, dos juízos, da atividade intelectiva e da afetividade de cada um.

A psicologia evolutiva aponta para a prevalência do Pensamento Mágico no homem primitivo, tal como uma espécie de pensamento pré-lógico, onde as fronteiras entre o real e o irreal são demasiadamente imprecisas. Tal PENSAMENTO MÁGICO está ainda bastante presente nas crianças e em adultos carentes de um socorro imediato às suas angústias e impotências. Está bem sabido, conforme Nobre de Melo observa, que esta não é a maneira habitual de pensar e de proceder do homem adulto e civilizado de nosso tempo. Este ser civilizado deve pautar sua conduta pelos princípios que regem o PENSAMENTO LÓGICO ou PENSAMENTO REFLEXIVO.

Há, entretanto, na mentalidade deste homem civilizado um grande número de reminiscências residuais primitivas e mágicas que vivem se reativando em circunstâncias especiais, tais como na ansiedade, na paixão, na incerteza, no sofrimento inconsolável, no perigo iminente e na desrazão . É assim que o ser humano moderno, motivado por sua angústia, insegurança e sofrimento, será capaz de apelar ao sobrenatural e à fantasia. É desta forma, subestimando a lógica e a razão absoluta, que nosso pensamento acabará tocando o irracional e a magia através de práticas individuais e íntimas variadas.

Assim sendo, constatamos, num sem-número de sistemas culturais e numa infinidade de pessoas, a utilização de todo um vasto arsenal de recursos mágicos para aplacar a angústia e o desespero. Aceitando esta convivência paralela e harmônica do mágico e do lógico na consciência do homem normal, podemos entender melhor o astronauta que não dispensa seu pé-de-coelho, ou o cientista que carrega uma pirâmide de cristal, o criminoso que porta um crucifixo, o aluno que só entra em provas sempre com o mesmo lápis, o jogador que veste a mesma cueca por ocasião de uma partida importante e assim por diante. O Pensamento Mágico e primitivo revive sempre nas crianças, esporadicamente nos adultos normais e predomina nos estados mórbidos ou de grande sofrimento emocional.

É desta forma que surpreendemos o irreal e ilógico no conteúdo e nas elucubrações do pensamento supervalorizado, delirante, obsessivo ou fóbico. Tais atitudes mentais são consideradas como uma espécie de REGRESSÃO da personalidade, onde vemos surgir toda a simbólica ancestral dos estágios mais remotos da evolução psicológica da espécie humana. São mecanismos de defesa mantidos em estado de latência mas susceptíveis de reascenderem todas as vezes em que se proceder uma ruptura no equilíbrio funcional da personalidade.

O Juízo e a Lógica, por outro lado, são duas operações intelectuais exercidas pelo pensamento reflexivo ou lógico. Porém, não obstante, nossos juízos estão sempre impregnados pela afetividade e pela vontade, de tal forma que todo julgamento é predominantemente subjetivo. Conforme Nobre de Melo, pode-se dizer que um juízo crítico, por mais fundamentado que possa ser, revela, às vezes, muito mais a natureza da pessoa que julga do que a qualidade da coisa julgada. Desta forma a própria razão, objeto do raciocínio lógico, também deve passar pela individualidade afetiva e, portanto, terá sempre uma racionalidade relativa por excelência.

Não será demais enfatizar que, em se tratando de conteúdo do pensamento, devemos levar em consideração todas as querelas sócio-culturais que permeiam a existência da pessoa considerada. A valorização do pensamento como um todo deverá, obrigatoriamente, relevar todas as circunstâncias atreladas ao panorama vivencial. Não fosse assim, com toda a certeza um dinamarquês consideraria um fenômeno francamente psicótico um pai de santo da Bahia. Da mesma forma, seria possível, à um observador menos avisado, classificar os japoneses kamikazes dentro das depressões suicidas.

Assim, o pensamento flui em função das associações e da forma. Representa um modo de ligação entre conceitos, uma seqüência de juízos e o encadeamento lógico de conhecimentos, de maneira dinâmica e contínua. Por outro lado, pode o pensamento abstrair-se em pressuposições hipotético-dedutivas, sem relação obrigatória com a realidade objetiva, em operações formais que aparecem no ser humano à partir dos 11 ou 12 anos.

Segundo Bleuler, no pensamento também está incluído algo de energético que se origina da afetividade: a finalidade, o conteúdo, o ritmo, a fluência e o tipo de pensamento são dirigidos pelas necessidades, interesses e tendências atuais. Emoções intensas, estado de ânimo, grau de vigília e cansaço podem modificar o pensamento. ... "no pensamento vive, portanto, o homem em sua plenitude".

O conhecimento humano representa um processo que começa com a sensação e termina com o raciocínio dialético. A sensação e o raciocínio são momentos diferentes, aspectos ou graus do mesmo processo do conhecimento. Por isso, não se pode separá-los. O mundo exterior age sobre nossos órgãos dos sentidos, provocando neles as sensações, e essas sensações em conexão indissolúvel com a atividade do pensamento oferecem o conhecimento dos objetos e de suas propriedades.

Sob a denominação de alterações do pensamento estudam-se as alterações da segunda fase do processo do conhecimento, isto é, os distúrbios do conhecimento racional ou intelectual constituído pela formação dos conceitos, a constituição dos juízos e elaboração do raciocínio.

Desenvolvimento do Pensamento (cognição)
No desenvolvimento do cérebro das crianças existem fases e etapas muito bem definidas, como se o exercício dessa função psíquica dependesse do aprimoramento do órgão, tanto quanto a habilidade para andar, falar, escrever, etc.

Segundo o modelo proposto por Jean Piaget, existem dois processos sobre os quais o ser humano vai organizar suas experiências e adaptá-las ao que foi experimentado, constituindo assim o perfil de sua consciência.

Estes processos seriam a Adaptação e a Organização. A Adaptação seria um processo de ajustamento ao ambiente existencial em torno do ser. No ser humano, ao contrário dos animais, essa adaptação não deve se reduzir exclusivamente às reação de agressões do meio e as respostas necessárias à sobrevivência do indivíduo e da espécie. No ser humano, a adaptação ao meio significa, sobretudo, a adaptação emocional ao meio.

A Organização da experiência inclui processos de combinação das informações provenientes dos órgãos dos sentidos e o desenvolvimento de uma sábia tendência a classificar ou agrupar esses estímulos em conjuntos ou sistemas. Trata-se do processamento mental das informações oferecidas pela existência e captadas pelo indivíduo através de seus sentidos (veja em PsiqWeb, Percepção, Sensopercepção, Procepção e Representação da Realidade).

Conhecer a evolução do desenvolvimento do pensamento infantil é importante para o entendimento do paralelo desenvolvimento da consciência. Piaget dividiu o desenvolvimento do pensamento da criança em quatro estágios:

I - Estágio Sensório-Motor
Esse estágio vai do nascimento até os dois anos de idade. Predomina, neste estágio, a atividade sensorial (dos 5 sentidos) e, quase totalmente, o bebê opera com ações do tipo olhar, tocar, pegar e sugar.

Aproximadamente com um mês de vida o bebê vai substituindo seus reflexos básicos e inatos (pegar, sugar, etc) por atitudes mais elaboradas, apesar de ainda sensoriais; aborda os objetos e pessoas de maneiras novas. Durante esse primeiro período de Piaget, um pouco mais (até 4 anos), é onde ocorre a maturação sensório-motora descrita na neurociência, faltando ainda a maturidade das regiões frontais e pré-frontais.

II - Estágio Pré--Operacional
O Estágio Pré-Operacional vai dos 2 aos 6 anos e se caracteriza pelo egocentrismo da criança. Nessa fase ela não consegue entender que as outras pessoas também têm direito de pensarem e agirem de forma diferente da sua.

Até os cinco anos, as crianças desenvolvem a percepção de formas, e os circuitos neurais da linguagem amadurecem mais ainda. A partir daí a linguagem organiza as ações, as quais passam a ser intencionais.

A partir dos 5 ou 6 anos o cérebro da criança começa a se especializar e os hemisférios (direito e esquerdo) passam a se ocupar de funções diferentes e bem definidas. Predominando em um a emotividade e em outro a cognição.

É nessa fase que a criança consegue, mais eficientemente, orientar seu corpo no espaço. Inicia-se o desenvolvimento do raciocínio lógico-formal, mas ainda predomina o raciocínio indutivo, isto é, a criança vê que duas coisas acontecem ao mesmo tempo e supõe que uma é a causa da outra.

Nessa época as crianças conseguem classificar objetos através da similaridade, havendo grande maturação de áreas sensoriais associativas sem, no entanto, conseguir-se ainda e plenamente um raciocínio formal.

III - Estácio Operacional Concreto
O Estágio Operacional Concreto vai dos 6 aos 12 anos. Nessa fase a criança se habilita para o esquema das operações, tais como a soma, a subtração, a multiplicação, a ordenação serial.

É nesse estágio que ela consegue desenvolver um raciocínio indutivo, bem como superar mudanças imediatas, considerar a relação lógica envolvida nos acontecimentos. Basta considerarmos a habilidade natural das crianças com essa idade para joguinhos de vídeo ou computador.

Mas elas ainda apresentam dificuldades em lidar com questões abstratas. Com a gradual maturidade dos lobos frontais, dá-se início ao raciocínio formal e a maior percepção emocional (veja acima a Área Pré-Frontal).

IV - Estágio operacional Formal
O Estágio Operacional Formal acontece dos 12 anos em diante. O desenvolvimento macroscópico do cérebro e das micro-redes neurais nessa fase já é praticamente satisfatório. A principal aquisição desse período é aprender a pensar e lidar com as idéias e objetos. A criança começa a considerar conscientemente as coisas imaginárias e as possíveis, torna-se capaz de lidar com os problemas de forma sistemática e metódica.

Nessa fase acrescenta-se ao pensamento indutivo, a recém criada lógica dedutiva, e é quando se tornam mais evidentes os eventuais déficits de desenvolvimento intelectual.
A partir dos 10 anos se observa um predomínio das funções simbólicas sobre a motora. O pensamento abstrato se torna independente da referência física e concreta das experiências.

Mais adiante, na adolescência, a pessoa já será capaz de formular hipóteses a partir de fatos abstratos e não concretos. Esta presente agora, o aspecto mais elaborado de pensamento humano; desprender-se do concreto. Os circuitos neurais macroscópicos já estão praticamente todos desenvolvidos e o cérebro adolescente se assemelha ao dos adultos.

Como vimos, o desenvolvimento do pensamento, através dos 4 estágios descritos por Piaget, se dá lentamente entre o nascimento e os 15 anos, aproximadamente. O mérito da observação de Piaget se afirma na constatação extremamente regular da sucessão desses estágios.

Entretanto, embora a sucessão dos estágios seja sempre a mesma, a velocidade desse desenvolvimento pode variar entre as diversas pessoas e entre os diversos meios sócio-culturais.

Com o passar do tempo toda a personalidade passa a ser absorvida pela Idéia Supervalirozada, a qual passa a exigir que se coloque à sua disposição todo comportamento do indivíduo. Este, por sua vez, será insuflado até o limite de verdadeiras façanhas ou atitudes heróicas, quando não, protagonista de tragédias monumentais. Encontramos o fanatismo presente em variadas figuras de nosso mundo cultural, em heróis épicos, em líderes religiosos e políticos, em personalidades carismáticas (como líderes religiosos, promovedores de suicídios coletivos).

Outra curiosidade que freqüentemente acompanha a trajetória dos indivíduos fanatizados é o fato de seu fanatismo aumentar ainda mais diante das situações que coloquem em risco a hegemonia de seus ideais. Isso faz com que suas atitudes adquiram muito mais ânimo e energia e se direcionem com heroísmo ao combate dos inimigos.

Com muita freqüência as Idéias Supervalorizadas coexistem com uma intelectualidade normal, portanto, até certo ponto, tais pacientes continuam gozando de perfeita mobilidade social e satisfatório desempenho ocupacional. Como a personalidade toda acaba por ser possuída pelas Idéias Supervalorizadas, logo a conduta social e ocupacional passam a servir aos propósitos fanatizados. Vem daí o empenho descomunal com que tais indivíduos atiram-se às suas tarefas, desde que, estas, como dissemos, atendam as aspirações superestimadas.

De modo geral, a idéia superestimada, prevalente ou supervalorizada reflete os traços dominantes da personalidade do indivíduo, daí a razão pela qual ele se identifica de modo completo com o seu conteúdo. De modo geral, as idéias superestimadas exercem uma influência danosa -sobre o pensamento, orientando-o de maneira inflexível em determinada direção. Essas idéias podem ser consideradas patológicas quando estão em francas oposição ao ambiente e à lógica comum à todos e adquirem esse caráter francamente patológico quando impulsionam a conduta do indivíduo também por caminhos contrários à lógica e à razão. A diferença entre essas idéias e as idéias delirantes é que nas supervalorizadas, faltam as características principais dos delírios, tais como a certeza subjetiva, a impossibilidade de influência e de conteúdo e o fato de não serem totalmente estranhas ao eu como ocorre no delírio.

Os indivíduos perdidamente enamorados, os cientistas, magistrados, militares, sacerdotes, políticos, seguidores de seitas esdrúxulas, cultuadores da saúde e do corpo, integrantes de cultos exóticos, pesquisadores de fenômenos ocultos e sobrenaturais, simpatizantes de entidades que pesquisam extra-terrestres, etc, quando possuidores de personalidade mais frágil e tenuamente atrelada à realidade, podem manifestar Idéias Supervalorizadas acerca de suas atividades e, ao mesmo tempo, como dissemos, conseguir manter uma satisfatória capacidade para o convívio social. Sem dúvida, esta situação mental limítrofe ou borderline aumenta a periculosidade destes indivíduos, principalmente tendo em vista o fato de que nosso sistema sócio-cultural nem sempre tem critérios para diferenciar o ideal do possível. A retórica, a eloqüência, a boa apresentação social e, às vezes, um diploma universitário ou uma boa conta bancária têm sido condições suficientes para atestar a sanidade mental, principalmente se a pessoa estiver trajando terno e gravata.

Há sempre a possibilidade das Idéias Supervalorizadas contaminarem outras pessoas, notadamente quando divulgadas por alguém com poder de projeção social. Não é incomum um fanático conseguir lotar o estádio do Maracanã com 150 mil pessoas, dispostas a doarem seus bens e despojarem-se de seus óculos mediante a promessa de que estarão curados de seus problemas de visão. Se as Idéias Superestimadas conseguirem atender os anseios íntimos dos espectadores elas, sem dúvida, os contaminarão. Numa retrospectiva histórica podemos detectar grandes grupamentos sociais que se deixaram envolver por Idéias Superestimadas, convenientemente propagadas, as quais resultaram em verdadeiro holocausto. E não faltam, hoje em dia, mais e mais novas correntes seguidoras de verdadeiros Ideais supervalorizados à respeito de variadíssimos temas de nosso cotidiano: a xenofobia, o nacionalismo, a "verdadeira palavra de Cristo", a cultuação do corpo, o esdruxulismo de antigos conhecimentos orientais (os quais, se fossem tão pródigos, teriam coletado inúmeras invenções para o benefício da humanidade, como por exemplo, as vacinas, a eletricidade, o rádio, o raio x, etc), e outras excentricidades típicas de quem não consegue se adaptar ao convencional de sua cultura.

Idéias Obsessivas
A intromissão indesejável de um pensamento no campo da consciência de maneira insistente e repetitiva, reconhecido pelo indivíduo como um fenômeno incômodo e absurdo, é denominado de Pensamento Obsessivo. Portanto, para que seja Obsessão é necessário o aspecto involuntário das idéias, bem como, o reconhecimento de sua conotação ilógica pelo próprio paciente, ou seja, ele deve ter crítica sobre o aspecto irreal e absurdo desta idéia indesejável.

Por definição, o pensamento obsessivo se constitui de representações que, sem uma tonalidade afetiva explicativa, aparecem na consciência com o sentimento de persistência obrigatória, impossibilitando seu afastamento por esforços voluntários e, conseqüentemente, dificultando e entorpecendo o curso normal das representações, mesmo que o indivíduo se dê conta de sua falta de fundamento, a falsidade de seu conteúdo e o caráter francamente patológico do fenômeno.

As Obsessões estão tão enraizadas na consciência que não podem ser removidas simplesmente por um aconselhamento razoável, nem por livre decisão do paciente. Elas parecem ter existência emancipada da vontade e, por não comprometerem o juízo crítico, os pacientes têm a exata noção do absurdo de seu conteúdo mental. Em maior ou menor grau, as Idéias Obsessivas ocorrem em todas as pessoas, notadamente quando crianças. Podem aparecer, por exemplo, como uma musiquinha conhecida que "não sai da cabeça", ou a idéia de que pode haver um bicho debaixo da cama, ou que o gás pode estar aberto apesar da lógica sugerir estar fechado. Em crianças aparecem como um certo impedimento em pisar nos riscos da calçada, uma obrigatoriedade em contar as árvores da rua ou os carros que passam, etc. Estas idéias obrigatórias, quando exageradas e promovedoras de significativa ansiedade ou sofrimento, constituem quadro patológico.

A temática das Idéias Obsessivas pode ser extremamente variável, entretanto, em grande número de vezes diz respeito à higiene, contaminação, transmissão de doenças, bactérias, vírus, organização ou coisas assim. É muito freqüente também a existência de Idéias Obsessivas sobre um eventual impulso suicida, como por exemplo saltar da janela de edifícios, ou em ser acometido subitamente por impulsos de agressão e ferir pessoas, principalmente os filhos. Neste último caso a obsessão está justamente em acreditar que, diante de um mal estar súbito, vir a perder o controle e executar, impulsivamente, aquilo que sugere tais idéias.

São muitos os exemplos de pessoas que adotam uma conduta excêntrica motivadas pela obsessão da contaminação ou pelo medo continuado de contágio diante de qualquer coisa que lhes pareça suspeita. Há ainda, casos de pessoas que se sentem extremamente desconfortáveis quando próximas de objetos pontiagudos, facas, foices, etc, devido a idéia indesejável de que podem, repentinamente e misteriosamente, perder o controle e matar uma pessoa querida. Um paciente teve que retornar das férias porque, estando hospedado num apartamento do quinto andar, ficava o tempo todo ansioso devido a idéia de que poderia saltar pela janela se um impulso incontrolável viesse à sua consciência. Em todos estes casos o paciente tem pleno juízo do absurdo de seus pensamentos e reconhece, sofridamente, sua impotência em controlá-los.

Desta feita, a Obsessão é um processo mental que tem caráter forçado, uma idéia associada a um sentimento penoso que se apresenta ao espírito de modo repetido e incoercível. São idéias impostas ao psiquismo, incômodas e sentidas como involuntárias, as quais entram na mente contra uma resistência consciente.

Por outro lado a similaridade entre Obsessões e Fobias (tratadas mais adiante) foi observada já em 1878 por Westphal, criador do termo FOBIAS OBSESSIVAS. Seriam medos que dominam a consciência, apesar da vontade do paciente que não consegue suprimi-los, embora reconheça-os como anormais. Aliás , vê-se muito bem, nos exemplos supra-citados, o componente de medo que normalmente acompanha as idéias Obsessivas. A Obsessão de doença e contaminação pode ser entendida como uma Fobia de doença, uma ruminação mental sem fim em torno da possibilidade de sofrer qualquer tipo de doença .

Ainda que o fenômeno obsessivo seja distinto do fenômeno fóbico, é sempre bom ter em mente que ambos podem ser faces distintas de uma mesma moeda ou, o que mais provavelmente poderia ser, a fobia originando obsessão e vice-versa.

Fobias
Tal qual a Obsessão, a Fobia intromete-se persistentemente no campo da consciência e se mantém aí independentemente do reconhecimento de seu caráter absurdo. A característica essencial da Fobia consiste num temor patológico que escapa à razão e resiste a qualquer espécie de objeção, temor este dirigido a um objeto (ou situação) específico .

A Fobia é um medo específico intenso o qual, na maioria das vezes, é projetado para o exterior através de manifestações próprias do organismo. Essas manifestações normalmente tocam ao sistema neurovegetativo, tais como: vertigens, pânico, palpitações, distúrbios gastrintestinais, sudorese e perda da consciência por lipotímia. As manifestações autossômicas externadas pela fobia têm lugar sempre que o paciente se depara com o objeto (ou situação) fóbico.

O pensamento fóbico é tão automático quanto o obsessivo e o paciente tem plena consciência do absurdo de seus temores ou, ao menos, sabem-no como completamente infundados na intensidade que se manifestam. Resistem, os temores, a qualquer argumentação sensata e lógica. Aliás, o medo só será fóbico quando considerado injustificável pelo próprio paciente e, concomitantemente, for capaz de produzir reações adversas comandadas pelo sistema nervoso autônomo.

O medo na Fobia ataca de modo incontrolável diante de objetos e circunstâncias de todo naturais e, diante das quais, mesmo o paciente reconhecendo como ridículas, não poderá dominar-se. A denominação das Fobias diversas guarda uma relação etimológica com as situações desencadeadoras: Agorafobia (espaços abertos ou sair de casa); Claustrofobia (lugares fechados); Acrofobia (alturas); Ailérofobia (gatos); Antropofobia (gente); Zoofobia (animais); Xenofobia (estranhos); e assim por diante.

As Fobias podem ocorrer juntamente com qualquer outro sintoma psiquiátrico, podem fazer parte de variados graus de ansiedade e de depressão ou ainda, em várias neuroses e psicoses. De fato, não se trata de nenhum sintoma patognomônico de algum quadro psicopatológico específico.

Veja mais sobre Fobias em Transtornos Fóbico-Ansisos

Delírios
Jaspers define o Delírio com sendo um juízo patologicamente falseado e que apresenta três características:

1. Uma convicção subjetivamente irremovível e uma crença absolutamente inabalável;
2. Impenetrabilidade e incompreensibilidade psicológica para o indivíduo normal, bem como, impossibilidade de sujeitar-se às influências de correções quaisquer, seja através da experiência ou da argumentação lógica e;
3. Impossibilidade de conteúdo (da realidade) .

Esta tríade proposta por Karl Jaspers é aceita pela psicopatologia clássica, notadamente pela tendência organodinâmica. É contestada, principalmente os itens 2 e 3, por autores psicodinâmicos, mais por uma questão de nosografia que de fenomenologia.

A prática clínica da psiquiatria deixa bem claro a constatação da primeira regra de Jaspers. Diante de um paciente delirante, cuja ruptura com a realidade é evidente, não conseguimos demover tal Conteúdo do Pensamento mediante qualquer tipo de argumentação. Caso o paciente deixe-se convencer pela argumentação da lógica, razoavelmente elaboradas pelo interlocutor, decididamente não estaremos diante de um delírio, mas sim de um engano por parte do paciente ou de uma formação deliróide. Para ser delírio a convicção dever ser sempre inabalável. A argumentação racional não deve afetar a realidade distorcida ou recriada de quem delira, independentemente da capacidade convincente e da perseverança daquele que se empenhar nesta tarefa infrutífera.

Em relação à segunda regra, Jaspers alerta sobre a impossibilidade do Delírio ser compreendido por pessoas que mantém vínculo sólido com a realidade. A lógica da realidade do delirante não é aplicável à lógica dos indivíduos normais, daí a falta de compreensão psicológica do Delírio: carece relação entre a temática delirante e os elementos da realidade, notadamente com a conjuntura vivencial do paciente. Ao postular esta regra tríplice Jaspers definia aquilo que chamamos de DELÍRIO PRIMÁRIO, ou seja, uma idéia falseada da realidade, cujas fantasias não desfilam elementos redutíveis de uma realidade especialmente vivida. Em outras palavras, esta irredutibilidade do Delírio quer dizer que não pode haver uma relação compreensível entre o tema delirante e possíveis vivência causadoras. O que se confunde, às vezes, são histórias de afastamento da realidade posteriores à traumas emocionais mas, como já dissemos, trata-se aqui de idéias deliróides e não de delírios francos.

Caso o Delírio se apresente de forma a sugerir um determinado mecanismo defensivo contra uma forte ameaça psíquica, normalmente angustiante, falamos em DELÍRIO SECUNDÁRIO ou IDÉIA DELIRÓIDE. Aí sim, podemos reduzi-lo à uma análise vivencial e psicodinâmica plausível. Foi o que aconteceu com um jovem de 23 anos, vítima de um acidente do trabalho que lhe custou a perda de quatro dedos da mão direita. Nos dias seguintes ao acidente começou apresentar uma expressiva inadequação afetiva (ao invés de aborrecido, mostrava-se feliz) e com um delírio no qual julgava-se Deus, cheio de poderes, auto suficiente e ostensivamente ameaçador para com as pessoas que dele duvidavam. Resumidamente, está claro que tal ideação emancipada da realidade era por demais compreensível: tratava-se de um mecanismo de defesa psicotiforme no qual, em COMPENSAÇÃO à mutilação e deficiência o seu poder passou a ser infinito. Trata-se pois de uma Idéia Deliróide (ou um Delírio Secundário), o qual habitualmente pode fazer parte de numa Reação Psicótica Aguda.

Delírios com temática semelhante ou mesmo igual ao exemplo exposto podem aparecer em pessoas sem nenhuma vivência justificadora, sem nenhuma possibilidade de redução dinâmica vivencial. Apenas aparecem e, aí sim, na impossibilidade de conteúdo ou de compreensibilidade estaremos diante de Delírio Primário. A Idéia Deliróide seria conseqüência de um estado afetivo subjacente e perfeitamente relacionável com uma vivência expressiva, por isso secundário.

A Idéia Delirante, ou Delírio, espelha uma verdadeira mutação na relação eu-mundo e se acompanha de uma mudança nas convicções e na significação da realidade . O delirante encontra-se imerso numa nova realidade de forma à desorganizar a sua própria identidade e se desorganiza pela ruptura entre o sujeito e o objeto, entre o interno e o externo, ou seja, entre o eu e o mundo.

Apesar do romantismo literário acerca da presumível viagem libertadora proporcionada pelos delírios por libertar o delirante das agruras de uma realidade sofrível, esta alteração do pensamento é considerada pela psicopatologia como uma das formas mais óbvias de empobrecimento mental, uma fixação regressiva e doentia que coloca o paciente num estreitíssimo corredor de possibilidades, numa quase ausência de livre arbítrio. Quer dizer exatamente o contrário daquilo que considerava a patologia da libertação; o delirante não é capaz de pensar aquilo que ele quer pensar, não tem possibilidades de admitir alternativas, falta lhe opção de raciocínio e é obrigado a conduzir-se estritamente nos trilhos estabelecidos pela sua doença.

É tal o empobrecimento mental do delirante que Henri Ey trata do assunto no capítulo reservado à Semiologia da Alienação da Pessoa e considera o Delírio como uma modificação radical das relações do indivíduo com a realidade. Trata-se, conforme Ey, de um distúrbio que se relaciona essencialmente com a concepção do mundo, manifestando-se através de uma inversão das relações do Ego com a realidade, enfim, uma alienação do Ego .

Segundo Kraepelin, "Delírios são idéias morbidamente falseadas que não são acessíveis à correção por meio do argumento". Bleuler, por sua vez, dizia que " Idéias delirantes são representações inexatas que se formaram não por uma causal insuficiência da lógica, mas por uma necessidade interior. Não há necessidades senão afetivas", determinava ele. Como percebemos, Kraepelin parece deter-se mais naquilo que entendemos por Delírio Primário, enquanto Bleuler já ventilava uma possibilidade do Delírio Secundário. Segundo Kurt Schneider a Ideação Delirante pode apresentar-se através de três configurações semiológicas :

Percepção Delirante
Fala-se em Percepção Delirante quando o paciente atribui, à uma percepção normal da realidade, um significado anormal sem que, para isso, existam motivos compreensíveis. Não existe, neste caso, uma verdadeira alteração da percepção mas é a interpretação dessa percepção que sofre um juízo crítico distorcido, patológico e com uma significação muito especial.

Nas Percepções Delirantes um acontecimento trivial, uma palavra despretensiosa, um acontecimento cotidiano, são representados com uma significância toda particular e morbidamente distorcidos por interpretações mágicas, ameaçadoras e cheias de conotações misteriosas. Normalmente as Percepções Delirantes se fazem em caráter de auto-referência, ou seja, tudo o que acontece à sua volta passa a referir-se ao paciente, a ele dirigido e com propósitos claramente comprometedores de sua pessoa.

Um paciente, exemplo de ideação auto-referente, ouvindo na televisão uma orientação sobre a AIDS, considerou haver uma suspeita geral acerca da possibilidade dele estar sofrendo da doença e, para ele, os comentários da TV eram uma prova de que todos estivessem suspeitando de sua contaminação. Um outro, vendo que a esposa tinha modificado a disposição dos frascos de perfume sobre a penteadeira, considerou isso um indício seguro de estar sendo traído. Mais um, vendo que seu cunhado havia comprado relógio novo, deduziu estar ele recebendo dinheiro de seus inimigos com o propósito de denunciá-lo.

Estas Percepções Delirantes normalmente compõem aquilo que chamamos de Delírio Sistematizado, ou seja, uma ideação organizada tal qual uma historieta; com começo, seqüência e fim. A temática central, na maior parte das vezes, é de referência ao paciente. Assim, DELÍRIO DE REFERÊNCIA é uma idéia delirante cuja temática implica sempre em prejuízo, perseguição, dano ou punição do paciente. É um tipo de Delírio freqüentemente encontrado nas Percepções Delirantes.

Ocorrência Delirante
Resulta de uma crença delirante, puramente subjetiva, sem a necessidade de um estímulo a ser percebido. Não há um estímulo percebido com significação anormal, como acontece na percepção delirante, o que existe é uma Idéia Delirante independente da motivação ambiental.
O conteúdo da Ocorrência Delirante se refere, principalmente, a convicções de ordem religiosa, política, de capacidades especiais do paciente, podendo haver também uma temática de ciúme e perseguição. É sinônimo de REPRESENTAÇÕES, COGNIÇÕES ou INTUIÇÕES DELIRANTES.
A caricatura do louco, estigmatizado pelo indivíduo que se considera Napoleão Bonaparte, exemplifica bem uma Ocorrência Delirante, ou seja, sem necessidade de interpretar estímulos ambientais ele simplesmente se acha Napoleão. Nossos exemplos mais comuns são de pacientes que se julgam possuidores de poderes sobrenaturais, telepatas, místicos, porta-vozes de divindades. Também os perseguidos, como uma senhora que referia uma cruel perseguição pelos vizinhos. Estes, seguidamente, viviam colocando animais peçonhentos em sua casa, instigando toda sorte de infortúnios. Na realidade estes vizinhos nem existiam, o prédio ao lado era um conjunto de escritórios.

Reação Deliróide
Em artigo de 1910, Jaspers relata dois casos que substanciam brilhantemente essa divisão entre Idéia Delirante e Idéia Deliróide . Ele sustentou, a certa altura, que o verdadeiro delírio de ciúme diferia de qualquer outra forma de produção mórbida de ciúme porque, em primeiro lugar, não partia de fatos reais (premissa falsa), logicamente aceitáveis e razoavelmente possíveis. Depois, porque não guardava nenhuma relação compreensível com disposições específicas de personalidade, com eventuais preocupações, com alguns complexos, conflitos ou com a dinâmica dos acontecimentos atuais. Para Jaspers, o verdadeiro delírio de ciúme não podia, pois, ser explicado como traço de uma personalidade anormal no curso de seu desenvolvimento, mas sim, como algo novo que se inseria, em dado instante na linha vital do indivíduo, fazendo supor um desvio abrupto ou de uma quebra, uma profunda transformação qualitativa da própria estrutura pessoal.

Desde essa época foram estabelecidas as diferenças essenciais entre as estruturas Delirantes e Deliróides. Jaspers afirmava que o verdadeiro delírio é um fenômeno primário por excelência. Como fenômeno primário ele queria dizer psicologicamente incompreensível para o homem normal, portanto, sem compreensibilidade à nossa personalidade e sem nenhuma semelhança com eventuais vivências psíquicas que somos capazes de representar coerentemente. Essas idéias resultam totalmente estranhas para nós, sendo, por isso, impenetráveis psicodinamicamente. Além do aspecto impenetrável, os juízos verdadeiramente delirantes devem trazer ainda o timbre da certeza subjetiva absoluta, da convicção interior irremovível. Essa não-influência psicológica seria, segundo Jaspers, outra característica típica da idéia delirante verdadeira, atestando assim sua irredutibilidade e incorrigibilidade, tanto por meio da persuasão lógica e irresistível, como através da evidência esmagadora dos fatos em contrário.

Na Depressão Grave, como sabemos e bem atestou Kurt Schneider, embora a tristeza vital seja considerada primária, no sentido de ser também incompreensível e psicologicamente irredutível, dela deriva e se vincula toda a gama de Idéias Deliróides depressivas. Essas Idéias Deliróides são pseudo-delírios ou Delírios Secundários, como os denomina Jaspers, por tomá-los psicologicamente compreensíveis e dentro do quadro clínico geral em que se formam. Atualmente fala-se também em Delírio Humor-Congruentes .

O mesmo fenômeno se observa no tocante às idéias de grandeza, tão bem observadas em estados maníacos como expressão natural do sentimento de onipotência. Nesses casos também devemos considerar o classicamente chamado delírio de grandeza como pseudo-delírio ou Idéias Deliróides, e não só aqueles observados nos maníacos, como também nos raros casos da paralisia geral progressiva. Nos maníacos estas Idéias Deliróides se mostram compreensíveis e explicáveis em função da forma clínica expansiva da doença e, nos luéticos, são explicáveis, portanto secundários, em razão do processo mórbido orgânico-cerebral subjacente, portanto, são igualmente secundários. Assim, pois, as Idéias Deliróides podem ocorrer em abundância e secundariamente nos estados maníacos e depressivos, nas psicoses orgânicas, em certos oligofrênicos leves , em personalidades psicopáticas, nos sociopatas e nas psicoses reativas.

O tema do delírio, entretanto, não é suficiente para dizermos tratar-se de uma Idéia Delirante ou Deliróide. Assim como Jaspers baseou-se em delírios de ciúme para definir a Vivência Delirante Primária, Bleuler se baseia no mesmo delírio de ciúme, porém em alcoólatras, para discorrer sobre uma Vivência Delirante Secundária.


saiba mais
acesse:
http://virtualpsy.locaweb.com.br/index.php?sec=47&art=263


para referir:
Ballone GJ - Alterações do Pensamento in. PsiqWeb, Internet, disponível em
www.psiqweb.med.br , revisto em 2005.