sexta-feira, 9 de abril de 2010

O Homem - Carnívoro ou Vegetariano?

O homem evoluiu como um animal carnivoro ou vegetariano?
Por Sérgio Greif, Biólogo.

É comum, atualmente, que no debate entre consumidores de carne e vegetarianos sejam utilizados argumentos relacionados aos "homens das cavernas", uns argumentando que os homens evoluíram como carnívoros e outros argumentando que evoluíram como vegetarianos. O presente texto traz considerações com relação a esse assunto.

Conforme a teoria evolutiva corrente, por volta de 6 e 7 milhões de anos atrás viveu nas florestas africanas um antepassado do homem do tamanho de um chimpanzé, denominado Orrorin tugenensis. Esse proto-homem passava a maior parte do tempo nas árvores, em busca de seu alimento (frutas e folhas), mas as vezes descia ao solo. A presença de grandes molares e de pequenos caninos sugere que esses hominídeos tinham uma dieta baseada em vegetais, mas podemos inferir que, eventualmente, insetos e pequenos vertebrados também fizessem parte de sua dieta, à semelhança do que ocorre entre os chimpanzés.

Por volta de 4 milhões de anos atrás, o aquecimento global (que já existia nessa época) reduziu grande parte das florestas africanas a savanas, e isso levou os antepassados do homem a buscar novas adaptações. O espaçamento entre as árvores e a necessidade de percorrer grandes distâncias para encontrar seu alimento levou a um maior desenvolvimento do bipedalismo (capacidade de andar em duas pernas). Surgia então o gênero Australopithecus, com representantes com pouco mais de 1 metro de altura, cérebro pequeno e rosto largo, cujos representantes mais conhecidos foram o A. afarensis e o A. africanus.

Devido às condições de seu ambiente e às suas limitações físicas, esses hominídeos encontravam grande dificuldade em encontrar boas condições para sua subsistência. As frutas já não eram tão abundantes como na floresta, e o capim, que agora abundava nas savanas, não era digerível. Também para obter outros tipos de alimentos eles tinham grande dificuldade, visto que esses hominídeos não eram bem adaptados à caça. Eles não eram rápidos o suficiente para alcançar uma gazela na corrida, nem tinham garras, presas ou força suficiente para abatê-las.

Por isso, a maior parte do tempo, esses hominídeos passava forrageando, se deslocando em busca de folhas, raízes e frutos que conseguisse digerir. Eventualmente, quando encontrava um animal doente ou já morto ele consumia a carne com voracidade, pois carne significava uma grande quantidade de calorias e nutrientes concentrados, em um mundo onde não se sabia quando seria a próxima refeição.

Onivoria, quando não se tem controle sobre o meio ambiente, é uma vantagem evolutiva, porque permite que se coma qualquer coisa e não se morra de fome.

Por volta de 2 milhões de anos atrás, a competição por recursos nas savanas africanas havia aumentado bastante. As florestas eram ainda menos abundantes e nas savanas proliferava uma fauna de grandes herbívoros pastadores; os grandes predadores eram mais eficientes no abate de presas e mesmo as carcaças por eles abandonadas precisavam ser disputadas com hienas e abutres.

O homem precisou então criar novas estratégias evolutivas: Ele precisaria se tornar tão bom pastador quanto os outros pastadores ou tão bom predador quanto os outros predadores. Ou seja, precisava se tornar competitivo.

O caminho adotado foi o da 'irradiação', da 'diversificação adaptativa'. Nesse período surgiram várias espécies de hominídeos, das quais conhecemos pelo menos 5 espécies. Um grupo de hominídeos, o gênero Paranthropus, optou por se especializar na alimentação à base de vegetais fibrosos e pouco nutritivos, por isso desenvolveu um corpo robusto, com mandíbulas pesadas, molares bem achatados e um trato digestivo que permitia o consumo de grande quantidade de alimentos. Essas adaptações permitiam que esse hominídeo processasse alimentos como o capim e as cascas de árvores. É provável que esses hominídeos fossem estritamente vegetarianos, o que não demandava a fabricação de instrumentos ou a elaboração de estratégias de caça. O Paranthropus tinha o corpo robusto, mas o cérebro era pequeno, e o ambiente era extremamente favorável ao seu estilo de vida.

Por essa mesma época surgiam nas savanas outros grupos de homens, hoje reconhecidos como a transição entre os Australopithecus e o que já reconhecemos como os primeiros homens pertencentes ao gênero Homo. Eles eram a princípio necrófagos que seguiam os grandes predadores em busca das carcaças abandonadas, mas com o tempo desenvolveram técnicas para abater suas próprias presas. Esse gênero, que não podia digerir capim e cascas de árvore, especializou-se na caça de animais, consumindo também, sempre que disponível, vegetais mais nutritivos. Suas principais adaptações foram o desenvolvimento de ferramentas de pedra cada vez mais elaboradas, de um sistema de comunicação mais articulado e, um milhão de anos após, no domínio do fogo.

Esses hominídeos, para desenvolverem sua capacidade de cognição (crescimento do cérebro) precisaram tirar a energia de outros órgãos. Considerando que a maior parte da energia corpórea era gasta para manter o trato digestivo e que o tipo de alimentação adotado se consistia em sua maior parte de alimentos calóricos com nutrientes concentrados, os intestinos desse homem diminuiu, à medida que seu cérebro aumentava.

Nesse período em que os dois gêneros (os Paranthropus vegetarianos e a os Homo onívoros) coexistiram, o vegetarianismo, ou herbivoria, apresentou-se como uma vantagem. Pode-se imaginar que o Paranthropus levasse uma vida tranqüila, vivendo em vales verdes abundantes em seus alimentos, sem se arriscar em caçadas ou competir com outros predadores; As espécies do gênero Homo, por outro lado, encontravam-se sempre no limiar da sobrevivência, quase minguando de fome, arriscando-se em caçadas e precisando deslocar-se por grandes extensões de terra para encontrar seu alimento.

Novas mudanças climáticas posteriores diminuíram as extensões dos pastos, e as áreas verdejantes, em sua grande parte, deixaram de existir. Os Paranthropus definharam. O gênero Homo, mais acostumado aos deslocamentos sucessivos e à falta de segurança alimentar sobreviveu. Somos descendentes desses homens.

Ao contrário do que se acredita, a paleoantropologia não defende uma sucessão linear, onde o Homo habilis tenha dado origem ao Homo rudolfensis e ao Homo ergaster, e que desse tenha surgido o Homo erectus, o Homo heidelbergensis que deu origem ao Homo neardentalis e ao Homo sapiens, espécie à qual pertencemos. A evolução de todas essas espécies aconteceu a partir de ancestrais comuns, muitos deles ainda não encontrados.

Importante é que entendamos que as condições em que a evolução humana se deu permitiram que o homem desenvolvesse sua inteligência para compensar seus desvantajosos atributos físicos. Pedras lascadas para compensar a falta de garras e presas, lanças para compensar a pouca velocidade, estratégias de emboscada para compensar a falta de resistência. A carne nos acompanhou grande parte desse tempo, seja da carcaça abatida por outros animais, seja por nossos próprios ancestrais, mas não porque seus nutrientes fossem essenciais. A carne era muitas vezes a única opção.



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